O mano Charlie. Então eu e a mãe fizemos o que era expectável. Certa noite, depois de jantarmos, deixámos que ele adormecesse e depois de aconchegá-lo na caminha, fomos silenciosamente para o nosso quarto. Fechámos a porta, e ao som de uma música soul, ligámos o iPad e começámos a ver cães para escolher um.
O mano Charlie
Pensámos “vai ser giro”. “Ele cresce com um cão como amigo e companheiro”. “Ganha sentido de responsabilidade, companheirismo e tal”. E assim entrou o Charlie para a família. O “mano” Charlie (um labrador chocolate) chegou com 3 meses à nossa casa e rapidamente ele e o meu filho tornaram-se melhores amigos.
De tal forma que na reunião de pais da escolinha, perguntaram-me se eu tinha outro filho ou se a minha mulher estava grávida. Tive de explicar que o “mano” Charlie de quem ele tanto falava na escola era um cão.
Claro está que isto não foram só rosas. Trabalho acrescido, atenção dividida, passeios na rua à chuva, apanhar cocós. Tudo coisas giras às 6 da manhã e às 10 da noite. E por isso uma das nossas missões mais difíceis tem sido habituar um a fazer cocó e xixi na sanita e o outro a fazer na rua.
Chegou a haver alguma confusão, é certo. Um dia o meu filho aparece-me à frente de t-shirt e nú da cintura para baixo. Diz-me “pai, fiz cocó” com ar orgulhoso. “O quê?” pergunto eu, meio confuso. “Fiz cocó. Ali.” responde ele. “Não percebo filho. O que queres dizer?” insisto.
Ele agarra-me na mão e leva-me até ao quarto dele. “Ali” aponta ele. No meio do chão do quarto, aquilo que eu não queria que fosse mas que sabia que era.Agora está tudo mais calmo.
Cada um faz o que tem a fazer no sítio próprio. Quase sempre. E o tal companheirismo confirma-se. É uma alegria ver aqueles dois a brincarem juntos. E os passeios de outono na praia em família tornaram-se um ponto alto da semana. Quando não chove.
Quanto ao sentido de responsabilidade, o meu filho é quem explica melhor. Um dia, sem que eu nunca tenha falado no assunto, vira-se para mim e diz: “pai pai, eu sou o adulto do Charlie, sabias pai”. “Sabia filho. E tenho muito orgulho em ti. Agora explica ao Charlie que cocó é só na rua. Talvez ele a ti ouça. E já agora se lhe pudesses dizer para deixar de comer a casa, era perfeito”.
Rui Manique Marques autor do blog Pés no Sofá