Os momentos mais marcantes de uma gravidez dá-se quando a mãe sente o seu bebé a mexer-se. Uma investigação recente sugere que os pontapés não são apenas pontapés. A cada pontapé, o bebé “mapeia [representa através de um mapa] o seu cérebro e constrói uma auto-estrada de informação”, avança a revista Live Science.
De acordo com a equipa de cientistas do estudo, esses pontapés, designadamente conhecidos por (primeiros) movimentos fetais, fazem com que o bebé construa uma rede cerebral de forma a compreender qual a parte do corpo que se está a mover e como está a ser tocada (por si próprio, pela mãe ou outro “humano”). Esta construção de redes cerebrais, mapeamento neural, dura até o nascimento.
“O toque é fundamental desde o nascimento, para o desempenho de algumas tarefas, como a amamentação“, explicou Kimberley Whitehead, da University College London (UCL), que co-liderou o estudo.
Os movimentos no útero preparam o bebé para a vida lá fora, fornecendo um “andaime neural” sobre o qual o cérebro construirá camadas de complexidade com novos tipos de estímulos sensoriais, declararam os investigadores.
As descobertas do estudo podem ter implicações nos cuidados neonatais, como por exemplo como envolver um bebé prematuro para que ele sinta que ainda está no útero e, dessa forma, desenvolver ainda mais essa rede cerebral.
Investigações anteriores descobriram que os movimentos espontâneos e o seu feedback observados logo após o nascimento são necessários para o mapeamento cerebral adequado em ratos. No entanto, os roedores nascem num estado menos desenvolvido do que os humanos recém-nascidos – os ratos bebés não abrem os olhos até os 13 dias de idade, por exemplo.
A questão para Fabrizi era se os seres humanos tinham o mesmo tipo de mapeamento cerebral precoce antes do seu nascimento.
Com vista a responder a essa questão, o laboratório de Fabrizi desenvolveu um estudo em colaboração com o University College London Hospital. Assim, iria examinar vários recém-nascidos, prematuros ou não.
Do estudo, publicado hoje em novembro na revista Scientific Reports, participaram 19 recém-nascidos, com uma média de 2 dias de idade, cuja idade gestacional corrigida variava entre as 31 e as 42 semanas.
(A idade gestacional corrigida tem em conta a sua idade, se os bebés ainda estavam no útero – um bebé nascido às 35 semanas de gravidez com 1 semana de vida fora do útero tem uma idade gestacional corrigida de 36 semanas.)
Como era feita essa observação?
Foi através de uma eletroencefalografia não invasiva (EEG) que os cientistas mediram as ondas cerebrais enquanto os bebés dormiam, concentrando-se nos momentos em que os recém-nascidos mexiam os membros (inferiores ou superiores) durante a etapa de sono R.E.M. (Rapid Eye Movement, em inglês). Rapidamente, encontraram evidências que demonstravam a existência de uma construção de ligações cerebrais, especialmente nos bebés prematuros.
Por exemplo, o movimento da mão direita de um bebé fez com que as ondas cerebrais disparassem imediatamente depois no hemisfério esquerdo do cérebro, responsável pelo processamento de informação do toque da mão direita. O tamanho dessas ondas cerebrais era maior nos bebés prematuros, que com a idade ainda estariam no útero, em comparação com os bebés nascidos a termo.
Kimberley Whitehead, co-autora do estudo, disse que os dados mais recentes da sua equipa, ainda não publicados, afirma que os outros aspetos do toque se desenvolvem nas primeiras semanas após o nascimento, como é o caso da combinação de informações do lado esquerdo e do lado direito do corpo.
“Esses padrões iniciais [desenvolvidos no útero] estabelecem os caminhos pelos quais a experiência após o nascimento pode trabalhar para refinar o mapa inicial”, declarou Whitehead à Live Science.
Para bebés prematuros, os resultados sugerem que manter um recém-nascido enrolado ou aninhado num berço pode ser benéfico para permitir que o bebé se sinta, quando se move, como se estivesse ainda no útero da sua mãe. Além disso, durante a observação do sono REM dos bebés, os investigadores falam da importância de um sono protegido, com os hospitais com o mínimo de distúrbios para o mínimo de procedimentos médicos necessários.