Hábitos orais nas crianças
Um artigo recente da Unidade de Odontopediatria da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto concluiu a existência de uma grande prevalência de hábitos orais em 1176 crianças dos 3 aos 13 anos de idade, e suas implicações ao nível da existência de anomalias na oclusão dentária.
Ora, os hábitos orais são definidos como comportamentos repetidos, prazerosos e inconscientes. Encontram-se diretamente relacionados com as funções do sistema estomatognático (sucção, deglutição, mastigação, respiração e fala).
Contudo, importa distinguir os hábitos orais nutritivos, que estão relacionados com a obtenção do alimento e o desenvolvimento da criança (ex: sucção do seio materno ou do biberão nos primeiros meses de vida), dos não-nutritivos, que dizem respeito aos hábitos que não têm um papel nutritivo e podem assumir sérias implicações no desenvolvimento orofacial da criança, consoante a sua intensidade, frequência e duração, a predisposição individual e a idade da criança. São eles:
- Sucção digital (chuchar no dedo).
- Sucção da língua, bochechas, lábios ou de objetos.
- Morder a língua, bochechas, lábios ou objetos.
- Bruxismo (ranger os dentes).
- Onicofagia (roer as unhas).
De acordo com vários autores, o surgimento destes comportamentos podem ter por base uma situação de insegurança, frustração, ansiedade ou angústia da criança, assim como a ausência de amamentação do seio materno nos primeiros meses de vida. Por outro lado, os hábitos orais podem surgir apenas como um comportamento acidental que, progressivamente, começou a ser realizado de forma repetida, perpetuando-se.
Quais as consequências?
Os hábitos orais podem trazer variadas implicações ao nível do desenvolvimento orofacial da criança:
- Alterações no desenvolvimento e posição dos dentes.
- Inadequações no posicionamento dos maxilares, lábios, língua e palato.
- Alterações nos movimentos necessários para mastigar e engolir os alimentos.
- Alterações ao nível da respiração (ex: respiração oral).
- Problemas de fala.
Como atuar na diminuição/eliminação de hábitos orais nocivos?
De um modo geral, a literatura recomenda a eliminação dos hábitos orais até aos 3 anos de idade, como forma de prevenir e diminuir o impacto futuro ao nível das estruturas orofaciais e das funções estomatognáticas (sucção, deglutição, mastigação, respiração e fala).
Primeiro, importa investigar o(s) acontecimento(s)/ causa(s) que motiva(m) a existência do hábito oral. Este é um passo importante uma vez, mesmo que o hábito oral seja extinto, não sendo investigadas as causas, a criança poderá substituir um comportamento por outro (exemplo: a criança deixa de utilizar a chupeta, mas começa a chuchar no dedo).
Para uma correta avaliação e intervenção ao nível dos hábitos orais, e respetivo impacto, é importante a colaboração do médico dentista, ortodontista, psicólogo e/ou terapeuta da fala, no sentido de desenvolver as respostas mais ajustadas a cada um dos hábitos orais e suas implicações no desenvolvimento orofacial (exemplos: orientações e aconselhamento parental; técnicas de modificação de comportamentos; terapia miofuncional; tratamento ortodôntico com aparelho dentário).
Para tal, é necessário que exista o envolvimento e o compromisso por parte da família e dos cuidadores, de forma a garantir que haja consistência nas estratégias desenvolvidas em todos os contextos significativos da criança (exemplos: casa; casa dos avós; casa dos padrinhos; jardim-de-infância; entre outros).
“É sempre bom considerarmos que cada criança é única e cada família tem suas crenças que devem ser respeitadas. (…) Cabe ao profissional de saúde esclarecer sobre os prós e os contras de cada atitude em relação ao desenvolvimento de cada criança e cabe à família escolher qual atitude adotar visando sempre o bem-estar do indivíduo que está em desenvolvimento.” (Casanova, 1998)
Referências bibliográficas:
- Casanova, D. (1998). A família e os hábitos orais viciosos na infância [Versão eletrónica], Monografia de conclusão do curso de especialização em Motricidade Oral – Fonoaudiologia Hospitalar, Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica, São Paulo, Brasil.
- Costa, M. F. F. A. (2012). Desenvolvimento da linguagem na criança: hábitos orais e perturbações da fala. Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal.
- Macho, V., Andrade, D., Areias, C., Norton, A., Coelho, A. & Macedo, P. (2012). Prevalência de hábitos orais deletérios e de anomalias oclusais numa população dos 3 aos 13 anos [Versão eletrónica], Revista Portuguesa de Estomatologia, Medicina Dentária e Cirurgia Maxilofacial, 53 (3), 143–147.
- Silva, E. L. (2006). Hábitos bucais deletérios [Versão eletrónica], Revista Paraense de Medicina, 20 (2).