Ah, palmadas, essa “estratégia pedagógica” tão evocada por pais, avós, familiares, professores, psicólogos, pediatras e demais profissões quando o tema da educação da criança vem à tona.
Muitas gerações foram educadas à base das palmadas e muitas das pessoas que fizeram parte dessas mesmas gerações referem que “foi a melhor coisa que lhes aconteceu”, porque aprenderam sobre o que é ter respeito, conhecer limites e, já agora, conhecer em primeira mão a dor física…
Eu próprio, em miúdo fui educado em certas vezes pelas chamadas “palmadas pedagógicas”.
Nos anos 80 era comum, quer em casa, quer na escola, quer em qualquer lado, a pedagogia das palmadas, das reguadas, da cana e das chapadas.
Quer se tenham levado poucas ou muitas, acredito que muito poucas são as pessoas que recordam com saudade o momento em que levaram uma valente reguada aos seus 6/7 anos. Provavelmente provocou choro, muitas de vezes engolido para se parecer forte em frente aos colegas da turma.
Aquele momento em que estendíamos a mão, antecipávamos a dor que aí vinha, aguardando quase de olhos fechados aquele meio segundo que parecia uma eternidade entre a preparação da reguada e a reguada propriamente dita.
No fundo estávamos a ser castigados do ponto de vista físico por algo que fizemos (mal), que começou na mente e acabou no comportamento manifestado.
E isso, sabemos hoje em dia, que não faz grande sentido quando falamos em pedagogia.
Acredito que esta estratégia possa ter nutrido algum efeito em certos comportamentos nas crianças que eram sujeitas a este tipo de agressão. No entanto, acredito também que trouxe muito mais dissabores à grande parte das crianças a que foram infligidas este tipo de castigos do que propriamente pedagogia ou educação.
Assim, nem reguadas, nem palmadas, nem chapadas, nem qualquer tipo de castigo físico deve ser infligido à criança por uma justificação é muito simples: se o que ela fez de mal foi consequência do seu raciocínio e do processo cognitivo inerente, deve ser reprimida, educada e orientada pela mesma via.
As crianças muitas das vezes manifestam-se indiretamente.
Um mau comportamento na escola pode indicar falta de motivação, falta de carinho, falta de autoestima ou até a falta do amigo que mudou de cidade e que agora não pode partilhar as brincadeiras com ele.
As crianças manifestam-se assim porque por um lado são muito mais genuínas que nós adultos e por outro, a linguagem (tal como muitas outras funções) ainda se está a desenvolver.
Quantas vezes em crianças fizemos uma asneira só para chamar a atenção dos nossos pais, ou porque simplesmente trouxemos para casa problemas que tivemos naquele dia na escola?
Quantos de nós agora em adultos não continuamos a fazer a mesma coisa?
Perceber o porquê do comportamento e atuar sobre isso é muito mais eficaz do que ver a questão do ponto de vista superficial e recorrer à pedagogia da palmada!
Não descuro apriori as gerações de pais que durante séculos utilizaram as palmadas como pedagogia para educar as gerações vindouras. Aliás naquele tempo a informação circulava com muito menos rapidez e qualidade também. Muitas das vezes estas estratégias passavam mais de geração em geração do que por especialistas ou pela ciência.
Acredito que nenhum pai (que seja digno desse nome) vê nas crianças uma espécie de “saco de pancada” que só aprende com as mesmas estratégias que ele próprio foi alvo em criança.
Felizmente a ciência tem evoluído a uma rapidez extraordinária. Nos últimos 20 anos tem-se comprovado que o castigo físico não é, definitivamente, uma estratégia pedagógica, muito menos de eficácia comprovada.
No entanto, este vazio que se criou precisa de ser preenchido e não simplesmente ser interpretado por pais e restantes cuidadores como uma leviandade na educação.
É preciso investir na própria educação dos educadores, para os capacitar de estratégias eficazes que não induzam trauma à criança, mas que ao mesmo tempo proporcionem uma educação saudável, justa e acima de tudo firme que tanto elas precisam hoje