Estamos à porta de um novo ano letivo. O ensino público reabre portas e salas de aula durante a próxima semana, mas são várias as instituições do ensino privado que já recomeçaram as atividades. Como está a ser este regresso?
O Colégio do Forte, em Vila do Conde, recebe crianças desde o berçário ao final do 3º ciclo. As aulas começaram a 3 de setembro. Desde o jardim-de infância e creche aos adolescentes do 9º ano, vamos perceber como é que está a ser encarado regresso no Colégio do Forte.
O Mãe-Me-Quer esteve à conversa com a professora do 1º ciclo, Inês Madureira, e com a diretora pedagógica do Colégio do Forte e educadora de infância, Maria João Gaspar, para perceber de que forma o colégio se está a adaptar à vida escolar durante a pandemia de Covid-19.
O ensino privado já começou o ano letivo na semana passada. Como tem sido o regresso às aulas? Que indicações é que acharam por bem levar a cabo e que adaptações tiveram de ser feitas?
Maria João Gaspar (MJG): O Colégio do Forte tem várias valências em funcionamento: creche, jardim de infância e depois o ensino básico. Nós nunca parámos [durante o confinamento], nunca deixámos de acompanhar as crianças.
Nessa articulação que fizemos à distância, tivemos sempre preocupação, não só com os conteúdos programáticos, mas também com o restante desenvolvimento das crianças, sobretudo as de idades mais tenras.
Fazíamos questão de enviar todos os dias, por e-mail ou por mensagem de telemóvel, propostas e planos de atividades, para que não se formasse um vazio. Na altura não sabíamos quando iríamos voltar.
A creche retornou no dia 18 de maio, quando foi permitido. Não tivemos a totalidade das crianças, mas tivemos a maioria. Mesmo aquelas que, por causa da profissão dos pais, seriam mais reticentes ao regresso.
Pais médicos e enfermeiros foram até aqueles que mais apostaram em fazer regressar os seus filhos à creche. O pré-escolar regressou a 1 de junho, também com a maior parte das crianças.
Nunca deixámos de fazer o trabalho à distância com as crianças que não regressaram presencialmente nestas datas. Não foi, nem está a ser difícil fazer cumprir as recomendações de higiene. Já antes da pandemia, tínhamos como prioridade no colégio, o trabalho com as crianças nestas áreas.
Eles sabem que têm de ter cuidado com o corpo, com a higiene, com a desinfeção das mãos. Eles já faziam isso, não foi o Covid que nos trouxe a exigência. O álcool-gel dentro do colégio sempre existiu.
Inês Madureira (IM): Em relação ao ensino básico, mantivemos também o plano de ensino à distância. Os grupos estavam diariamente em contacto com os seus professores, numa carga horária mais reduzida ou intercalada, para evitar que passassem demasiadas horas seguidas em frente ao computador.
Acontece que o nosso retorno presencial acontece a 26 de junho, porque após o encerramento do ano letivo, o estado permitiu que abríssemos a componente de apoio à família. Nós temos um campo de férias de verão e pudemos realizar essa campo de férias.
Nos primeiros quinze dias tivemos 50% das crianças do colégio. Não tínhamos essa adesão tão grande nos outros anos. Isso foi bastante positivo, porque permitiu-lhes recuperar os laços afetivos.
Este retorno às aulas foi um recomeçar de uma série de regras de higienização que nós já tínhamos no colégio, mas que também já tínhamos reforçado quando começaram a surgir os primeiros casos de Covid-19, em Portugal.
O Colégio do Forte acionou um plano de contingência para “e se acontece aqui”. Quando as crianças voltaram ao presencial, já estavam habituadas. Não houve drama, porque os adultos também não o demonstraram. O dito “novo normal” não é uma expressão que se use aqui no colégio, porque aqui não é novo.
Além das medidas obrigatórias e daquelas que já tinham implementado previamente, tiveram que fazer alguma alteração a nível de infraestruturas?
IM: A nível de infraestruturas, tivemos de colocar sinalizações nos corredores, para os alunos se deslocarem à direita. Apesar de nós já incutirmos nas crianças essa prática. Neste momento, a única diferença é que o percurso está assinalado no chão e temos alguns sinais de proibido ou de sentido obrigatório nas portas.
O que criámos foi uma entrada específica para profissionais e para crianças não acompanhadas pelo pai ou pela mãe, para agilizar o processo de entrada na escola. Para não criar filas muito grandes, damos prioridade aos meninos mais pequeninos, que devem entrar acompanhados pelos pais.
Os mais velhos já se despedem do lado de fora da entrada. Está a correr muito bem, porque até os alunos que transitam do primeiro para o segundo ciclo já se sentem crescidos e querem ir pela entrada dos alunos não acompanhados.
Portanto, foi isto que fizemos, sinalizar os espaços de circulação e criar esta nova entrada mais ágil. O resto nós já tínhamos. A desinfeção do calçado à entrada através do tapete triplo, de limpeza desinfeção e secagem, já tínhamos os dispensadores de álcool-gel na entrada. As crianças têm as mãos desinfetadas na passagem do nosso pórtico de validação do cartão por um adulto.
Tentamos desvalorizar o impacto destas mudanças, não no que toca à sua importância, mas no sentido do seu confronto. Ou seja, levar aquilo como uma brincadeira.
Por exemplo, o desinfetante é a água de colónia do Colégio do Forte e vamos pôr o nosso perfume. Com os mais crescidos, eles já frequentam lojas e restaurantes, não temos dificuldades.
MJG: Uma das exigências não só pela Direção-Regional de Saúde, mas também pelo Ministério da Educação é a questão da máscara. Andamos todos de máscara, o colégio tem máscaras personalizadas para os docentes e não docentes.
IM: No caso do ensino básico, nós andamos também de viseira, ergonómica, totalmente transparente. Por vários motivos: para nossa proteção individual, porque podemos lidar com as crianças [mais pequenas] que não usam máscara, e também para proteger as crianças no caso de nós adultos precisarmos de a remover.
Isso pode acontecer por dois motivos. Os alunos do 1º ano estão a ser introduzidos à leitura e à escrita. Se o professor não consegue mostrar a boca, a criança não vai conseguir distinguir sons nem perceber a articulação das palavras.
E também por causa dos nossos alunos surdos, que precisam de ver a nossa boca para comunicarmos e reforçar as tecnologias que os acompanham.
Há também situações em que sorrir com os olhos não chega e a criança precisa desse conforto. Nesse caso, afastamo-nos o suficiente e tiramos a máscara momentaneamente para as crianças verem o nosso sorriso.
O número de alunos por turma, ou em cada sala, é um tema que tem preocupado os pais. Como é que o colégio articula esta questão?
IM: No nosso caso, nós somos uns privilegiados. A nossa sala mais pequena tem sensivelmente 55 metros quadrados. A nossa maior turma tem 15 crianças. E esta turma está numa sala de 60 metros quadrados.
Sempre apostámos em espaços grandes e grupos pequenos, por uma questão pedagógica. Somos uns privilegiados nesta questão, o nosso colégio está mais do que preparado para estas exigências. Os corredores são largos, o polivalente é enorme…
Os grupos já faziam as rotinas desencontradas, trabalhamos imenso no jardim. Esta adaptação ainda não está a ser muito significativa, é mesmo só a responsabilidade acrescida.
É seguro então assumir que as crianças estão a reagir de forma positiva e a assumir as suas rotinas, no regresso às aulas?
IM: Estão a reagir com imensa naturalidade. Há conversas de meninos que dizem que no colégio nem parece que há Covid, porque já tínhamos todos esses comportamentos antes.
Depois de grande parte dos alunos passarem tanto tempo fora da escola e mesmo com todo o acompanhamento que foi feito, existe alguma preocupação específica a nível de saúde mental das crianças?
MJG: Essa era a nossa preocupação. Como é que nós vamos receber as crianças, até as mais pequeninas, depois de estarem tanto tempo reservadas em casa? Era essa a nossa maior interrogação. Foi uma grande surpresa para nós: eles acabaram por nos confortar mais depressa do que nós os precisámos de confortar a eles.
Querem abraço, beijinho, colo. Dizemos-lhe que o abraço podemos dar, o beijinho já não… E que temos de ter cuidado com a higiene. Percebemos que este distanciamento não os prejudicou tanto como nós inicialmente pensámos que podia ter prejudicado.
Penso que as crianças conseguiram enfrentar isto muito bem. De recordar que tudo o que nós fazemos dentro do colégio já fazíamos antes. Assim que apareceram os primeiros casos, a direção organizou várias formações para docentes e não docentes para perceber o que precisávamos e fazer.
IM: No ensino básico, também tem sido um início tranquilo nesse aspeto. As crianças tinham saudades do colégio. O regresso ao colégio foi um regresso a casa também, um regresso a uma estabilidade.
Definimos desde o início que na equipa não poderia haver pânico. Aconteça o que acontecer, a postura da equipa é sempre calma em momentos de crise. Assim a criança também fica calma, caso aconteça alguma coisa ou haja alguma suspeita.
As crianças não estão afetadas. Vemos mais os pais preocupados quando nos entregam a criança.
De qualquer maneira estamos sempre atentos e conversamos bastante com os grupos, para lhes tomar o pulso e perceber o que é que estão a sentir. No caso de detetarmos que alguma criança, por uma fator ou outro, revela alguma ansiedade, nós temos uma equipa multidisciplinar com uma psicóloga, que acionamos imediatamente.
Os pais têm tido um feedback positivo? Apesar de existir sempre algum receio, têm notado uma atitude positiva?
IM: Muito positiva. Os pais sorriem-nos imenso, agradecem. Vão embora com um sorriso e cumprem também todas as regras. Acompanhamos, principalmente, na iniciação [1º ano], as crianças aos pais, para que haja um momento de reencontro.
Temos também o nosso contacto de sala. Cada sala tem um e-mail e o feedback que temos recebido aí é sobretudo de agradecimento e confiança.
Qual é o plano de contingência no Colégio do Forte, caso se detete algum foco de infeção? Ou algum conjunto de sintomas suspeitos?
IM: Prevemos que no caso de uma ou mais crianças revelarem sintomas, são encaminhadas através de um circuito próprio para uma sala de isolamento. Esta sala tem uma acesso exterior junto a uma saída de emergência. No caso de uma criança apresentar sintomas é acompanhada para esta sala por um tutor, que está designado no nosso plano de contingência.
É acionada a coordenação de valência e a direção e é contactado de imediato o encarregado de educação. Temos de aguardar a chegada do encarregado de educação ao colégio para contactar a Saúde24, por causa a proteção de dados, sendo que se trata de um menor. Caso haja um agravamento durante o período de espera , é acionado o 112.
Depois de o responsável chegar, contactamos a Saúde24 e seguimos as instruções dadas. A criança sai com o encarregado de educação para ir ao hospital ou ao médico, sendo que só pode regressar com uma declaração que comprove que não tem uma doença infecto-contagiosa, como acontece em todas as escolas.
Claro que temos também de contactar o delegado de saúde da zona, neste caso de Vila do Conde. A partir daí seguimos os procedimentos estabelecidos.
O Colégio do Forte caracteriza-se por um modelo educativo focado num sistema de organização e de estruturas cooperadas entre si, onde a base construtivista se edifica em circuitos de comunicação e participação democrática entre adultos e crianças. É uma referência do ensino privado, na Área Metropolitana do Porto.