A displasia da anca é uma doença congénita que afeta cerca de 1 em cada 100 bebés mas apenas 1 em cada 1000 sofrerá de um verdadeiro descolamento da anca. O diagnóstico e o tratamento precoces são aspetos fundamentais para um tratamento bem sucedido. Saiba como é diagnosticada esta patologia, como é realizado o tratamento e as eventuais consequências para a saúde e qualidade de vida futuras da criança.
Displasia da anca
O que é a displasia da anca?
A displasia da anca é um problema ortopédico que causa alterações na articulação da anca, sobretudo em recém-nascidos, lactentes e crianças. Também designado como luxação congénita da anca (LCA) tem vindo gradualmente a ser substituído pelo conceito de displasia de desenvolvimento da anca (DDA).
A displasia de desenvolvimento da anca deve-se à malformação do acetábulo (superfície articular da bacia que, em conjunto com a cabeça do fémur, formam a articulação da anca). A malformação do acetábulo faz com que a relação entre a cabeça do fémur (parte superior do osso da perna) e a superfície do osso da bacia (ilíaco) fique alterada o que impede a correta contenção do osso da perna.
Causas da displasia de desenvolvimento da anca
A maioria dos problemas ortopédicos diagnosticados à nascença ou em recém-nascidos (do nascimentos aos 28 dias de vida) deve-se, na sua maioria, à redução do espaço no útero, particularmente, no 3º trimestre da gestação (anomalia de modelação).
Entre os fatores de risco para displasia de desenvolvimento da anca incluem-se:
- Bebés do sexo feminino: a doença é mais frequente nas meninas porque são mais suscetíveis a certas hormonas maternas durante a gravidez que causam relaxamento dos ligamentos das articulações (laxidão ligamentar). Contudo, em muitos casos, cerca de 1 a 2 semanas após o diagnóstico o problema passa espontaneamente, sem necessidade de tratamento;
- Apresentação pélvica no parto (quando o bebé não dá a volta e fica com o rabo ou os pés virados na direção do canal de parto) e, especialmente quando o joelho também está esticado para além do seu limite causando um desalinhamento na rótula (hiperextensão do joelho);
- Oligoidrâmnio (quantidade reduzida de líquido amniótico no útero);
- Bebés de baixo peso à nascença;
- Primeiro bebé;
- Gravidez de gémeos (menos espaço no útero);
- História familiar (displasia de desenvolvimento da anca confirmada em um familiar em primeiro grau ou em mais que um familiar afastado);
- Fatores geográficos / étnicos: há maior incidência na raça branca e nos nativos da América do que nas raças negra e asiática.
Importância do diagnóstico precoce
Como a maior parte das crianças com displasia de desenvolvimento da anca não tem factores de risco e a maior parte das crianças com factores de risco não tem a doença, o diagnóstico precoce e o exame físico de rotina é fundamental para intervir prontamente e minimizar as consequências da doença.
Quando é o problema diagnosticado?
Uma vez que a displasia de desenvolvimento da anca não apresenta sintomas, é importante que o diagnóstico seja realizado numa fase precoce, pois é nessa fase que o tratamento resulta por inteiro.
As consultas de rotina do 1º ano de vida são o momento indicado para observação. Nestas consultas, o pediatra examina as articulações da anca para despistar a existência de alguma anomalia. Este tipo de exame físico é realizado em todas as consultas até a criança começar a andar.
O diagnóstico também se pode fazer até à idade adulta se o problema não for detetado durante a infância.
Como é realizado o diagnóstico de displasia da anca?
O diagnóstico é efetuado no gabinete do pediatra, quando o recém-nascido / bebé está descontraído e permite a observação. O exame não provoca dor nem desconforto e a maioria dos bebés reage bem.
Contudo, quando o exame não é realizado numa boa altura, quando o bebé está menos tolerante a manobras, tem frio ou fome, por exemplo, pode reagir com impaciência ou chorar.
Manobra de Ortolani-Barlow
O bebé é despido (sem fralda) e o médico coloca os polegares na articulação da anca e roda a perna e a anca para fora delicadamente. Quando se sente um clique, trata-se da cabeça do fémur (parte superior do osso da perna) a reentrar no encaixe da anca. O exame é realizado em ambas as pernas, uma de cada vez.
Exame da assimetria de pregas
O pediatra também irá verificar se as dobras das nádegas são simétricas sendo esta outra forma de observar se existe algum problema nas articulações da anca.
Exames auxiliares de diagnóstico
Caso o pediatra considere necessário, poderá ser pedido um exame auxiliar de diagnóstico (ecografia ou radiografia – RX – das coxo-femorais) para confirmar ou não a presença displasia da anca. No entanto, não há consenso sobre quais as crianças que deverão ser submetidas a métodos imagiológicos (devido à exposição aos raios X em idade precoce).
Tratamento da displasia da anca
Quando se verifica algum indício de displasia da anca em recém-nascidos com idade inferior a duas semanas, o pediatra pode decidir aguardar mais algum tempo para observar como evolui a situação.
Nos recém-nascidos, a maioria das ancas instáveis estabilizam pouco tempo após o nascimento, à medida que a cabeça do fémur e acetábulo se desenvolvem, normalizando espontaneamente.
Se o problema não passar naturalmente, os bebés têm de usar um arnês para manter a anca fletida e evitar um descolamento total da anca. O arnês aperta e mantém a estabilidade da anca e permite que os ossos cresçam normalmente. Este tratamento dura entre 2 a 3 meses e tem uma taxa de eficácia que ronda os 95%.
Quando o diagnóstico é realizado tardiamente, após os 6 meses de vida, poderá ser necessário recorrer a cirurgia para posicionar os ossos da articulação da anca na posição correta. No período pós-operatório, a criança usa um “molde em abdução” por um período de 3 a 4 meses.
Nas situações em que o diagnóstico é realizado em idade precoce, a anca deverá estar completamente normal por volta dos dois anos de idade. Se o problema não for devidamente tratado e acompanhado, podem surgir complicações como dificuldade de marcha, coxear, dores articulares, uma perna mais curta do que a outra ou artrose da anca (especialmente nos casos de diagnóstico tardio).
Pontos a reter
- A displasia de desenvolvimento da anca é uma patologia potencialmente incapacitante, que não apresenta sintomas nos primeiros meses de vida;
- As consequências de um diagnóstico tardio ou mal conduzido poderão ser extremamente graves e difíceis de tratar;
- O diagnóstico precoce (antes dos 6 meses) é fundamental que o tratamento resulte;
- A vigilância (exame físico) deve ser feita de modo regular, em todas as consultas de rotina do bebé, até a criança ter uma marcha normal e estável;
- Os pais têm um papel importante na deteção precoce da doença porque, primeiro, convivem diariamente com o filho e podem observar e acompanhar o desenvolvimento e falar com o pediatra sobre eventuais anomalias e, depois, respeitando a periodicidade das consultas infantis;
- Caso se suspeite de displasia de desenvolvimento da anca, a criança deve ser imediatamente reencaminhada para uma consulta de especialidade (ortopedia pediátrica).
Bibliografia: SANT´ANNA, Francisco. Doença displásica da anca – Conceitos básicos e orientações em Medicina Geral e Familiar. Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, [S.l.], v. 25, n. 4, p. 445-9, jul. 2009. ISSN 2182-5173. Disponível em: http://www.rpmgf.pt/ojs/index.php/rpmgf/article/view/10649. Acesso em: 05 out. 2017.