Um total de 9697 crianças foram vítimas de violência doméstica entre 2014 e 2018, lê-se numa notícia do jornal Público. Segundo a mesma fonte, isto correspondeu a 8,5% dos casos de violência doméstica em Portugal durante o mesmo período.
Estes números foram avançados pelo psicólogo António Castanho na Conferência Internacional sobre Violência Doméstica – o papel dos advogados. O evento decorreu a 29 de outubro último, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
O psicólogo António Castanho citou aqueles números com base numa análise efetuada a dados da secretaria-geral do Ministério da Administração Interna.
Mais de 1.000 crianças órfãs em consequência de casos de violência doméstica
Segundo a mesma fonte noticiosa, efetuaram-se 114.000 avaliações de risco de violência doméstica nos quatro anos mencionados. Em 74% dos casos, os agressores usaram força física. Em 8,5% dos casos as vítimas foram crianças (ver acima). Noutros 8,5% dos casos, as vítimas eram mulheres grávidas ou que tinham filhos com menos de 18 meses de idade. Esta última percentagem traduz-se em mais de 9.200 vítimas.
“As crianças expostas à violência doméstica têm um aumento do risco de problemas psicológicos, sociais, emocionais e comportamentais, incluindo perturbações do humor e ansiedade, PSPT, abuso de substâncias e problemas académicos”.
Em 21% dos casos de violência doméstica, os agressores exerceram violência contra o resto do agregado familiar.
AProcuradora-Geral da República (ACF) divulgou que mais de 1.000 crianças ficaram órfãs em consequência de violência doméstica entre 2004 e 2018. António Castanho recordou ainda que naqueles 14 anos foram mortas 503 mulheres, vítimas de violência doméstica.
Crianças presenciaram 37, 7% de situações de violência doméstica
Mas os números não ficam por aqui. Segundo, a mesma notícia do Público, o psicólogo lembrou que 84.767 do casos de violência domésticas, ocorridos entre 2010 e 2018 e registados pelas forças de segurança foram presenciados por crianças.
Este número corresponde a uma percentagem de 37,7% dos casos de violência doméstica perpetrados em frente a crianças naqueles oito anos.
“A violência doméstica (…) tem impacto na vida de milhares de crianças em Portugal”
Segundo a visão da Procuradora-Geral da República, Lucília Gago, a violência doméstica é um “fenómeno social grave, complexo e altamente impactante na vida de milhares de adultos, mas também na vida presente de futura de milhares de crianças e jovens”.
A magistrada falava na sessão de abertura da conferência sobre violência doméstica (ver acima). Lucília Gago alertou ainda para o risco de a violência doméstica poder tornar as suas vítimas em possíveis agressores. A magistrada referia-se, assim, ao facto de este flagelo poder ser transmitido de geração em geração.
“O ato favorece a propagação, por mimetismo, da violência, mormente da violência doméstica, o que agrava o seu efeito de banalização e da sua difusão por transmissão intergeracional com terríveis consequências no tecido social”, observou.
Consequências devastadoras para as crianças
“A violência doméstica interrompe, destrói e tem impacto na vida de milhares de crianças em Portugal”, concorda António Castanho. O psicólogo citou vários estudos que sublinhavam as consequências devastadoras da violência doméstica nas crianças.
António Castanho referiu que “as crianças expostas à violência doméstica têm um aumento do risco de problemas psicológicos, sociais, emocionais e comportamentais, incluindo perturbações do humor e ansiedade, PSPT, abuso de substâncias e problemas académicos”.
“O stress e o trauma na infância não é algo que simplesmente se supere com o tempo”, disse. Com efeito, “a intervenção precoce, a redução da exposição à violência e intervenção psicológica têm impacto positivo no desenvolvimento do cérebro e na saúde mental”, explicou.
António Castanho é de opinião que se pode fazer muito mais para quebrar o ciclo de violência. Para tal, o profissional apresentou três possíveis medidas interventivas:
- Dar resposta no dia a seguir a um episódio de violência doméstica
- Dar resposta imediata a crianças vítimas de homicídio a nível nacional
- Fazer triagem de violência doméstica nas consultas de Obstetrícia, Planeamento Familiar e Pediatria
A Procuradora-Geral da República considera ser necessário “implementar melhores abordagens” para travar a violência doméstica. Referindo-se ainda às crianças, Lucília Gago disse que mesmo quando não são alvos-diretos, as crianças acabam sempre por ser seriamente afetadas. A magistrada referiu ainda que o dano provocado por situações de violência doméstica “nem sempre é valorizado”.