Em altura de confinamento, os aparelhos eletrónicos acabam por ser os melhores amigos das crianças nas pausas dos trabalhos de casa, e dos pais, que se encontram em regime de teletrabalho, o que não é positivo.
Perante as dificuldades em conciliar o trabalho com o apoio às crianças e lides domésticas, muitos pais tendem a ceder às soluções rápidas e eficazes que a tecnologia lhes proporcionam para maximizar o tempo.
Tempo de ecrãs aumenta entre as crianças durante a quarentena
De acordo com um estudo de uma empresa de tecnologia infantil, SuperAwesome, as crianças entre os 6 e os 12 anos passam cerca de 50% do seu tempo de quarentena em frente a ecrãs de dispositivos tecnológicos.
Nos últimos anos, esta matéria tem sido alvo de vários estudos e tema central de diversos debates públicos, devido às consequências no desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo que podem surgir quando usados em excesso (o que é, obviamente, subjetivo e pode variar de acordo com as crenças de cada família). Ainda assim, estes dispositivos vieram para ficar e revolucionar a forma como a comunicação é realizada, estando agora a um mais fácil alcance das crianças. É, porém, importante frisar que a sua utilização nem sempre é nociva, pois é esta tecnologia que lhes permite, nestas ocasiões extraordinárias, manter contacto com os seus pares, tendo assim alguma interação social, prevenindo também desta forma o isolamento.
Pamela Vitória, de 34 anos, mãe de Laura, de 4, declara, em entrevista à revista Crescer, que o uso dos aparelhos era limitado antes do surgimento do Covid-19, o que mudou com o confinamento: “Dou mais liberdade, mas não totalmente. Até porque as atividades da escola estão vinculadas aos dispositivos, que também amenizam a distância das pessoas. Mas aviso sempre quando está perto da hora de desligar”.
Vários estudos e especialistas indicam que o uso excessivo destes dispositivos podem afetar:
- o sono, visto que a luz azul dos ecrãs interferem na produção de melatonina, hormona que regula o ciclo do sono;
- provocar dores nas costas das crianças, devido à má postura que adquirem quando estão sentados e à permanência na mesma posição;
- prejudicar a audição;
- aumentar os distúrbios visuais;
- aumentar a incidência da obesidade, uma vez que pressupõe um maior sedentarismo e, consequentemente, uma menor atividade física.
Segundo a neuropediatra e presidente do Departamento Científico de Desenvolvimento e Comportamento da Sociedade Brasileira de Pediatria, Liubiana Arantes de Araújo, existem recomendações específicas para cada faixa etária:
- As crianças até aos 2 anos de idade apenas deve ter contacto com aparelhos eletrónicos em caso de chamadas/videochamadas com familiares. Caso seja exposta em demasia, o desenvolvimento da linguagem da criança pode ser afetado;
- Entre os 2 e os 5 anos, apenas devem ter acesso a apps ou conteúdos que sejam adequados à sua idade e didáticos, e a sua interação com o aparelho eletrónico não deve exceder uma hora diária.
- A partir dos 5 anos de idade, a duração de visualização e interação com dispositivos tecnológicos duplica, passando assim para duas horas por dia, no máximo.
Existem ainda recomendações gerais que servem todas as faixas etárias da população infanto-juvenil:
- Evitar conteúdos de violência, algo muito presente em jogos;
- Atividades devem ser realizadas com a monitorização dos pais:
- Não ceder à sua utilização durante as refeições e à noite.
Além disso, de acordo com o pediatra Daniel Becker, da Pediatria Integral, é ainda essencial proteger as crianças das fake news relativas à pandemia, que somam e seguem ganhando destaque em diversos canais digitais, como o WhatsApp.
“Evite o contato direto da criança com este tipo de conteúdo. Explique que, neste momento, muitas pessoas estão a ficar doentes, mas que isso vai passar. Trabalhe sempre com a esperança e adeque as notícias à capacidade de compreensão de cada faixa etária“, explica.
Um princípio básico: não descurar as regras
Mas, apesar de ser importante o contacto com o exterior através dos ecrãs, há que manter algumas regras para o bem de todos.
“Não deixe a criança ficar o tempo todo no tablet, computador ou a ver televisão. Numa situação atípica, dá para tolerar um pouco, mas estar sempre nesses dispositivos não é uma alternativa atraente. Tente organizar o seu tempo para conseguir ficar mais horas com o seu filho, ainda mais neste momento em que todos estão stressados“, declara a pediatra Flávia Nassif à Crescer.
Ao invés de usar estes aparelhos durante a maior parte do dia, divida-o em períodos e tente encaixar alguns blocos para brincar entre as aulas/trabalhos de casa e o trabalho. Nesses momentos, opte por estimular a criança através de jogos de tabuleiro, de cartas, puzzles, cantiga e dança, de uma ajuda extra na cozinha para preparar umas refeições com a ajuda do(s) pequeno(s).
Se, no entanto, tiver um dia bastante atribulado e com muitas tarefas, o ideal será altercalar os jogos educativos com filmes/séries e algumas brincadeiras (estas não podem faltar). Como diz o título de um outro artigo, “deixem as crianças brincar” e participem também nesses momentos.