O que são as responsabilidades parentais
O conceito de poder paternal desapareceu já da nossa legislação, tendo sido definitivamente substituído pela nova denominação de responsabilidades parentais. A mudança de nome pretende também significar uma mudança de paradigma: mais do que um poder ou direito, em matéria de filhos os progenitores são, antes de mais, titulares de responsabilidades ou, se se quiser, de deveres.
As responsabilidades parentais podem ser definidas como “o conjunto dos poderes e deveres destinados a assegurar o bem-estar moral e material do filho, designadamente tomando conta da sua pessoa, mantendo relações pessoais com ele, assegurando a sua educação, o seu sustento, a sua representação legal e a administração dos seus bens” (Recomendação n.º R (84) de 28/02/84 sobre as Responsabilidades Parentais do Comité de Ministros do Conselho da Europa).
A regra, no nosso país, é a do exercício conjunto das responsabilidades parentais, querendo isto significar que as decisões mais relevantes para a vida da criança cabem a ambos os progenitores. Só não será assim se, mediante decisão fundamentada, um tribunal entender que o exercício conjunto é contrário ao superior interesse da criança. Já as decisões correntes, do dia-a-dia , serão tomadas pelo progenitor que, em cada momento, tem a criança ao seu cuidado.
Assim, um conjunto significativo de decisões deverão ser tomadas por ambos os progenitores. Alguns exemplos dessas decisões serão:
- a definição do local de residência da criança;
- a escolha do ensino público ou ensino privado;
- as intervenções cirúrgicas, nomeadamente as estéticas ou aquelas que impliquem risco para a vida ou integridade física;
- o exercício de atividades laborais (incluindo atividades artísticas);
- a orientação religiosa até aos 16 anos;
- as viagens para o estrangeiro;
- a prática de atividades desportivas que impliquem risco para a vida, saúde ou integridade física.
Já as decisões correntes, e que incumbem ao progenitor que tem a criança ao seu cuidado naquele momento, serão as mais corriqueiras, como a definição da hora das refeições e da hora de deitar, saber se a criança deve ver TV ou brincar, etc.
Com qual dos pais residirá a criança após o divórcio ou separação?
Consumada a separação ou o divórcio, uma das questões fundamentais a decidir pelo ex-casal, e que maior impacto poderá ter na criança e na família, é a da fixação da residência desta.
Irão adotar o regime da residência alternada em que a divisão do tempo das crianças é tendencialmente equivalente com cada um dos progenitores? Ou, ao invés, irão preferir um modelo de residência exclusiva, em que os filhos residem a maioria do tempo com um dos pais? Não existem soluções milagrosas, e cada família deverá saber encontrar a solução que melhor satisfaça o superior interesse da criança.
A decisão relativa à residência da criança, bem como, eventualmente, o regime de contactos com o outro progenitor, se for adotada a residência exclusiva, cabe ao ex-casal que deverá formalizar um acordo nesse sentido. Não existindo consenso, será o tribunal a decidir de acordo com o critério do superior interesse da criança ou do jovem.
Residência alternada?
A residência alternada é, ao menos em teoria, o modelo que melhor salvaguarda o direito da criança, legalmente consagrado, ao convívio com ambos os progenitores. Sabemos, porém, que poderá não ser a solução ideal para todas as famílias.
Na verdade, é necessário, desde logo, que se verifiquem as condições para a sua implementação: a proximidade da residência dos pais entre si e relativamente à escola, a disponibilidade de ambos para assegurarem as rotinas da criança no período que lhes cabe, etc. A residência alternada pressupõe também, idealmente, que os pais tenham alguma capacidade de comunicação e de gestão dos conflitos.
É de notar que o modelo da residência alternada pode ser adotado em qualquer idade das crianças. Porém, deverá ter-se em consideração que nem sempre será adequado que a transição entre as residências dos progenitores se faça semanalmente. Na verdade, dizem-nos pediatras e psicólogos que no caso de crianças em idade pré-escolar as transições deverão ser mais frequentes, de três em três ou de quatro em quatro dias, por exemplo. Na verdade, só contactos frequentes e regulares com cada um dos progenitores asseguração que ela estabeleça com cada um deles uma relação de vinculação segura. Não esqueçamos que a noção de tempo em crianças em idade pré-escolar não vai muito além do ontem, hoje e amanhã, pelo que o período de tempo que passa com cada progenitor deve respeitar este aspeto do seu desenvolvimento.
Do mesmo modo, e quanto a estas crianças mais novas, não é adequado preverem-se períodos de férias de 15 dias seguidos com cada um dos progenitores. É importante incluir-se uma interrupção a meio das férias para que a criança possa conviver com o outro pai ou mãe.
A este propósito, refira-se que me deparo frequentemente com acordos referentes a crianças muito novas, em idade pré-escolar, e que prevêem regimes de residência alternada semanal. Estes acordos foram elaborados por advogados, obtiveram parecer favorável por parte do Ministério Público e foram homologados por um juiz do Tribunal de Família e Menores ou um Conservador do Registo Civil. E, no entanto, os pais não foram alertados para o facto de que o ideal seria efetuar as trocas de três em três ou de quatro em quatro dias.
Daí que há muito se vem reclamando a necessidade de formação específica interdisciplinar, nomeadamente da área da psicologia, para os profissionais da justiça que têm intervenção nesta área, em linha, aliás, com os compromissos internacionalmente assumidos pelo Estado Português (Cf. as Diretrizes do comité de Ministros do Conselho da Europa sobre a justiça adaptada às crianças, de 17 de novembro de 2010).
Residência Exclusiva?
Nem sempre a residência alternada será o regime mais adequado. Desde logo não o será nos casos em que não existam condições logísticas para a sua implementação, porque as residências dos progenitores são muito distantes entre si e/ou relativamente à escola; porque um dos progenitores não tem disponibilidade para cuidar da criança durante o período de tempo que lhe caberia; porque um dos progenitores não deseja ficar com a criança metade do tempo, preferindo que ela fique maioritariamente ao cuidado do outro, etc.
Nestes casos, a criança reside com um dos pais (o progenitor residente) e é fixado um regime de convívios com o outro (o progenitor não residente). Mesmo neste regime, porém, é importante que os contactos com o progenitor não residente sejam frequentes, presencialmente e/ou à distância.
Regime de visitas ou de contactos com o progenitor não residente
Na eventualidade de ser fixado à criança um regime de residência exclusiva com um dos progenitores, haverá que prever-se um regime convívios com o outro progenitor. Tais contactos deverão ser extensos e frequentes, sendo certo que, paralelamente, deverá prever-se que o progenitor que não está com a criança deverá poder contactar com ela telefonicamente, idealmente por meio de videochamada, e frequentemente, porventura todos os dias.
É também importante estipular que a criança deverá continuar a manter contactos com a família do progenitor não residente, e a frequentar os eventos festivos familiares paternos e maternos, nomeadamente, aniversários de avós, tios, primos, etc. A participação nestes eventos familiares poderá e deverá constar do teor do acordo a formalizar entre os progenitores.
Não logrando os progenitores alcançar um consenso relativamente ao regime de visitas, caberá ao Tribunal fixá-lo, atendendo, claro está, ao critério do superior interesse da criança.
Quais os direitos dos avós?
Os avós são, por vezes, “vítimas colaterais” no âmbito dos conflitos parentais. Apesar de alheios às “guerras” com que se ocupam pais e mães, acabam por ver o seu direito de convívio com os netos cortado.
Noutros casos, não existe qualquer conflito parental, mas sim entre um ou ambos os progenitores e os avós, não permitindo que estes contactem com os netos.
Ambas as situações são, infelizmente, mais comuns do que se poderia imaginar.
Ora, é hoje entendimento pacífico que o convívio entre as diferentes gerações, especialmente no âmbito do mesmo núcleo familiar, é extremamente importante para um crescimento harmonioso e equilibrado das crianças. A partilha das memórias familiares, e os afetos que apenas os avós nos podem transmitir, fazem parte integrante de um processo de crescimento estruturado da criança que deve envolver a sensação de pertença a uma família alargada.
A lei prevê, em consequência, que os pais não podem, sem justificação, privar as crianças do convívio com os avós e outros ascendentes (bisavós, por exemplo). Tal somente poderá suceder se, porventura, esse convívio fosse julgado contrário ao superior interesse da criança. E, na realidade, existem casos em que se justifica impedir o contacto entre uns e outros, designadamente por se entenderem tais contactos como prejudiciais à criança ou jovem.
Assim, e sendo privados de contactos com um neto, os avós poderão reivindicar junto do Tribunal de Família e Menores a fixação de um regime de visitas que será em tudo idêntico àquele que é fixado para os próprios progenitores. O tribunal fixará dias e horários de visita, com maior ou menor regularidade, a fim de permitir um convívio mutuamente gratificante entre uns e outros.
Privar uma criança, sem razão justificada, do contacto com os avós não é, pois, admissível e não deverá ser tolerado.
Nuno Cardoso Ribeiro
Advogado de Família