Considerados sérios desafios para a saúde pública do século XXI pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o excesso de peso e a obesidade atingem atualmente mais de 30% das crianças em idade escolar, o que coloca Portugal entre os países da Europa com as maiores taxas de prevalência de obesidade pediátrica.
A obesidade, doença complexa que resulta principalmente do desequilíbrio continuado entre o consumo alimentar e o gasto energético/atividade física é causada por múltiplos fatores, nomeadamente, genéticos (particularmente quando ambos os pais têm excesso de peso), biológicos, comportamentais, psicossociais, ambientais, entre outros.
A obesidade pediátrica tem contribuído para o aumento de doenças como a diabetes tipo 2, hipertensão, doenças cardiovasculares, complicações respiratórias, ortopédicas, gastrointestinais e metabólicas.
O excesso de peso e a obesidade são ainda mais preocupantes em idade pediátrica uma vez que tendem a manter-se na idade adulta, estando estreitamente ligados ao desenvolvimento de várias doenças crónicas, perda de qualidade de vida e baixa autoestima.
Conheça alguns erros comuns que promovem o excesso de peso infantil e promovem um estilo de vida pouco saudável.
1. “Comer por dois” na gravidez
Os hábitos alimentares na gravidez refletem-se não só na da saúde da mãe mas também no desenvolvimento do bebé. A dieta deve ser variada e rica em proteínas, sais minerais, fibras vegetais, entre outros nutrientes essenciais para o crescimento bebé e para o bem-estar materno.
A obesidade, diabetes ou hipertensão não controladas durante a gravidez têm uma influência bastante negativa no desenvolvimento da criança. Se a alimentação da mãe for desequilibrada, isso vai refletir-se não só na sua saúde, com a possibilidade do desenvolvimento da diabetes gestacional ou outras complicações, mas também contribuir para o aumento do risco de o bebé ganhar mais peso do que o desejável, alterando o seu equilíbrio metabólico, ainda antes de nascer.
2. Não amamentar ou desmamar muito cedo o bebé
A OMS recomenda o aleitamento materno exclusivo, em regime livre, até os seis meses de idade. Entre outros benefícios, os bebés alimentados apenas com leite materno têm menos hipóteses de se tornarem obesos na adolescência e na vida adulta.
Por outro lado, vários estudos indicam que os bebés amamentados são menos resistentes a novos sabores uma vez que o sabor do leite materno se altera de acordo com a dieta materna. Apesar de beber exclusivamente leite, o bebé “prova” diferentes sabores através da alimentação da mãe.
3. Não respeitar a quantidade de leite adaptado
No caso de bebés não amamentados, os leites adaptados de produção industrial são a alternativa.
A quantidade de leite em pó que se prepara para cada fase do desenvolvimento do bebé varia de acordo com o peso e idade, devendo ser respeitado escrupulosamente o modo de preparação que dita na embalagem.
Aumentar a dose do leite em pó, fazer “medidas a olho” ou “meias doses” não só não contribui para uma melhor nutrição como sobrecarrega o sistema digestivo e os rins ainda imaturos do bebé. No caso de dúvida sobre a quantidade de leite a oferecer ao bebé, deve consultar-se o pediatra.
4. Não corrigir maus hábitos alimentares e culpar os genes
Os fatores genéticos são um dos responsáveis pela obesidade mas o principal contributo são os hábitos e o estilo de vida. Ingerir mais calorias do que as necessárias e não praticar exercício físico regularmente são comportamentos que promovem o excesso de peso em qualquer fase da vida.
O exemplo dos pais é essencial para a definição das preferências e hábitos alimentares dos filhos. A família é o modelo da criança e se os pais optam, frequentemente, por refeições tipo fast food e refrigerantes ou se não consomem fruta e vegetais regularmente, é previsível que a criança desenvolva o mesmo comportamento.
5. Não estabelecer regras e rotinas
Após os primeiros 6 meses, inicia-se a fase da alimentação complementar com a introdução de novos alimentos na dieta do bebé. Após 6 meses a beber exclusivamente leite, alguns alimentos, como os legumes, podem provocar alguma resistência devido ao seu sabor (vários estudos evidenciam que temos uma apetência natural para o doce).
Contudo, é importante não desistir de os oferecer ao bebé gradual, paciente e lentamente. Estudos têm demonstrado a necessidade de oferecer várias vezes o alimento recusado para que o bebé comece, finalmente, a aceitá-lo.
Com a diversificação alimentar, é necessário criar uma rotina e estabelecer horários fixos para as refeições o que permite ao bebé criar ritmo e aprender a comer a determinadas horas. Progressivamente, as refeições integram-se nas da família e a criança deve estar sentada à mesa e partilhar desse ritual.
6. Não compreender as fases do desenvolvimento infantil
A partir do 7º mês de idade, a dieta passa a incluir comida partida aos pedaços, que o bebé pode levar à boca com as mãos, e a consistência das papas deve aumentar por forma a que se habitue a diferentes texturas.
A partir do momento em que consegue mastigar pequenos pedaços de comida, é importante incentivar o bebé a fazê-lo. Igualmente importante é lembrar que quando o bebé se alimenta sozinho, precisa de mais tempo e que o seu ritmo deve ser respeitado e integrado nos horários da família.
Dar de comer ao bebé para abreviar a refeição ou fazê-la mais líquida e oferecer no biberão, por exemplo, não promove a autonomia, o desenvolvimento das competências motoras ou a aquisição do gosto por saborear diferentes sabores e texturas.
7. Não educar precocemente a criança para a alimentação saudável
Desistir de oferecer legumes só porque o bebé os rejeita nas primeiras tentativas ou dar sobremesas lácteas em vez de fruta fresca, por exemplo, não contribui para o desenvolvimento do gosto por uma alimentação diversificada, natural e saudável.
O açúcar e o sal são de evitar no primeiro ano de vida. Recomenda-se não adicionar sal a purés e sopas de legumes para não “mascarar” o sabor dos alimentos e, a partir do momento em que começa partilhar as refeições da família (por volta dos 10-12 meses), os temperos devem ser moderados.
Outra prática comum é adicionar açúcar à fruta para a tornar mais “apetitosa“. No entanto, a fruta quando consumida in natura não precisa de adição de açúcar para ser apetecível, porque é naturalmente doce.
Por vezes, esta é uma perceção dos pais que, por não apreciarem determinada fruta, pensam que o filho terá o mesmo comportamento de rejeição.
8. Não privilegiar uma alimentação simples e natural
À medida que a criança prova novos alimentos, com texturas, odores e sabores diversos, desenvolve naturalmente o paladar e preferência por certos e determinados alimentos.
Quando a alimentação se baseia em refeições salgadas pré-preparadas ou em boiões de fruta industriais, é normal que rejeite os alimentos cozinhados de forma simples e natural, onde o verdadeiro sabor dos alimentos se destaca e prevalece.
Também é necessário educar para gostar de provar e apreciar novos sabores e texturas. Esta é uma importante lição porque, ao longo da vida, a criança será exposta a novidades gastronómicas e deve aprender a não rejeitar novos alimentos “porque não gosto” sem, pelo menos, os provar.
Igualmente importante é incentivar o consumo de água ao longo do dia, em pequenas quantidades. Ocasionalmente, pode oferecer um sumo de fruta natural ou um chá de ervas, mas sempre sem adição de açúcar. Sumos industriais, néctares de fruta ou refrigerantes, opções ricas em açúcar e corantes, são desaconselhadas nos primeiros nos de vida.
9. Não respeitar o apetite da criança
Obrigar a criança a comer para além das suas necessidades energéticas ou usar a força para comer mais do que lhe apetece, cria associações negativas ao momento da refeição e induz um comportamento conflituoso com a comida. Também os adultos têm dias em que lhes apetece comer menos ou que preferem um determinado alimento.
Usar os doces como prémio é outra estratégia desaconselhada. Se não quer comer, deve aguardar até à próxima refeição, sem petiscar nos intervalos. Usar os doces como recompensa parece afirmar que “comes uma coisa boa se comeres uma coisa má” e esta associação não ajuda a criança a alterar o comportamento de rejeição face aos alimentos menos preferidos.
Cada alimento tem vantagens por si só e os pais devem explicá-las claramente aos filhos. Só assim compreenderão verdadeiramente a importância de fazer uma alimentação variada.
10. Não incentivar um estilo de vida ativo
Está demonstrado que os hábitos da família influenciam e condicionam o estilo de vida das crianças.
Após as refeições, as crianças precisam de exercício para queimar energia. Todas as brincadeiras ajudam a gastar calorias. Não é necessário praticar uma modalidade de competição, mas a criança deve ser estimulada a praticar algum desporto, a brincar, a mexer-se.
Ficar em frente à televisão mais do que 2 horas por dia ou a jogar no computador sem regras, são comportamentos que convidam ao sedentarismo. Para além disso, brincar é muito mais do que gastar energia. Brincar é um estímulo fundamental ao desenvolvimento motor e intelectual infantil.