Normalmente, quando ouvimos falar de icterícia, associamo-la imediatamente à chamada tiriça no recém-nascido. No entanto, a icterícia pode surgir em qualquer idade, inclusivamente nas crianças. Este artigo explica o que é, os tipos, causas e tratamentos possíveis.
O que é a icterícia?
A icterícia é um problema relacionado com o fígado. Costuma ser fácil de reconhecer pois dá à pele e esclera (branco dos olhos) uma coloração amarelada.
Embora esta condição seja bastante comum e passageira em recém-nascidos (icterícia neonatal), quando afeta crianças e adultos poderá indicar um problema de saúde mais sério. Por isso, tem que ser investigada mais a fundo.
A cor amarelada da pele e esclera característica é causada pela acumulação de bilirrubina no organismo. Esta substância de cor amarelo-alaranjada é produzida quando a hemoglobina (a parte dos glóbulos vermelhos que transporta oxigénio) é decomposta durante o processo normal de reciclagem dos glóbulos vermelhos danificados. A maior parte da bilirrubina é eliminada nas fezes enquanto uma pequena parte sai pela urina.
Quando o fluxo da bilirrubina pelo fígado e canais biliares diminui, esta substância acumula-se no sangue, sendo depositada na pele. O resultado é a a hiperbilirrubina ou icterícia.
Se o seu filho apresentar sintomas de icterícia deve ser visto por um pediatra.
Sintomas em crianças
Como vimos, o sintoma mais óbvio e característico da icterícia é a coloração amarelada da pele e da esclera ocular. Contudo, há que estar atento a outros sintomas pois podem denunciar uma doença mais grave:
- Febre
- Dor abdominal
- Fezes de cor pálida
- Urina escura
- Náuseas
- Exaustão
Se o seu filho experienciar estes sintomas e demonstrar sofrimento ou agitação, deve ser observado por um médico com urgência.
Causas da icterícia em crianças
No recém-nascidos, a icterícia normalmente aparece devido ao facto de o fígado não estar suficientemente desenvolvido para excretar a bilirrubina.
No entanto, nas crianças já não é assim. Assim, podemos dividir a icterícia em três tipos, segundo a causa da mesma:
- Obstrutiva: causada pelo bloqueio na vesícula biliar entre o fígado e o pâncreas
- Hepatocelular: consequência de doença ou lesão no fígado
- Hemolítica: provocada por uma reciclagem anormal de glóbulos vermelhos, o que leva a um excesso de bilirrubina no sangue
São muitas as causas que podem conduzir à icterícia. Por isso é tão importante que esta seja analisada por um médico para que a criança possa receber o tratamento adequado. Abaixo, pode encontrar as causas mais comuns para este problema.
Hepatite
A hepatite é uma inflamação no fígado que pode ser causada por vários fatores. O mais frequente são os vírus.
O fígado é um órgão responsável por várias funções no organismo. A remoção de toxinas, digestão e armazenamento de energia são alguns exemplos.
A hepatite desenvolve-se quando o fígado não consegue desempenhar alguma das suas funções corretamente. Um dos sintomas comuns da doença é a icterícia.
Existem seis tipos de hepatite: A, B, C, D, E e G. As formas mais frequentes nas crianças são a hepatite A e a E pois são principalmente de transmissão fecal-oral.
Esta doença pode-se curar por si só, apenas com descanso e dieta. Contudo, pode evoluir de forma negativa causando cicatrizes (fibrose), cirrose, cancro ou até insuficiência hepática.
Existem vacinas para prevenir a hepatite A e a hepatite B. Já se desenvolveu e testou uma vacina para a hepatite E, mas ainda (2021) não é comercializada em Portugal.
Vírus Epstein-Barr
O vírus Epstein-Barr (EBV), também conhecido como herpesvírus humano 4, é um dos vírus mais espalhados pelo mundo. Calcula-se que mais de 90% da população dos países desenvolvidos se torne portadora do vírus antes de chegar aos 20 anos de idade. O EBV afeta tanto crianças, como adultos.
Após ser contraído, o vírus permanece no organismo durante a vida inteira. Contudo, uma criança portadora pode não demonstrar sintomas, e nem problemas de saúde. No entanto, os casos mais raros podem ser manifestados por febre, inchaço nos nódulos linfáticos e icterícia.
Este vírus é normalmente é transmitido através dos fluídos corporais, como a saliva. Assim, uma criança que partilhe um copo ou a escova de dentes com alguém infetado pode contrair o EBV.
Anemia hemolítica
A anemia hemolítica é uma doença que causa o ataque e destruição, pelo próprio organismo, dos glóbulos vermelhos no sangue. A doença afeta principalmente os adultos mas pode também ser contraída por crianças.
Os sintomas da anemia hemolítica passam pela fadiga, palidez, mal-estar, tonturas e, claro, icterícia.
Esta doença pode ser derivada de uma infeção, doença autoimune ou outros fatores. A anemia hemolítica pode também ser de origem hereditária, sendo transmitida por um ou ambos os progenitores.
Cálculos biliares
Os cálculos biliares (não confundir com cálculos renais ou “pedra no rins”) são depósitos de material sólido, predominantemente de cristais de colesterol, na vesícula biliar. A vesícula biliar é um pequeno órgão situado abaixo do fígado.
Embora nem sempre se consiga identificar a razão para o desenvolvimento dos cálculos biliares, podem ser devidos a um excesso de bílis no colesterol da criança, ou então a um excesso de bilirrubina na bílis. Se a vesícula biliar não excretar a bílis de forma adequada, este fluído acumula-se, formando os cálculos biliares. Um dos sintomas é a icterícia.
Cancro
A icterícia pode ser um dos sintomas de cancro do fígado ou do pâncreas. No entanto, é raro acontecer a crianças.
Diagnosticar a icterícia
Diagnosticar a icterícia poderá não ser feito através de um exame físico e observação pelo pediatra da pele e olhos da criança. No entanto, diagnosticar o que causou a icterícia pode ser bem mais complexo.
Observação
Mediante a presença da icterícia, o pediatra poderá procurar quaisquer sinais de patologia no fígado. Portanto, na sua observação poderá tentar identificar a existência de pisaduras (hematomas), de angiomas estelares (as chamadas “aranhas vasculares”) e ainda de eritmema palmar (cor avermelhada nas palmas das mãos). Finalmente, poderá ainda verificar se o fígado aparenta estar inchado.
Análises ao sangue e urina
A criança com icterícia poderá efetuar ainda análises ao sangue e à urina pode detetar níveis elevados de bilirrubina, assim como anemia e problemas no funcionamento do fígado. A hepatite e o vírus de Epstein-Barr são também detetáveis através de análises ao sangue.
No caso de a criança apresentar anemia para além da icterícia poderá ter que fazer um outro exame, conhecido como teste de Coombs. Este exame identifica a presença de anticorpos que estejam a atacar os glóbulos vermelhos, indicando uma doença autoimune.
Tratamento
Como poderá deduzir, o tratamento da icterícia está dependente do problema subjacente.
Problemas ligeiros: nas crianças poderá não ser necessário qualquer tratamento para a icterícia. Assim que a causa da icterícia se resolve, esta desaparece também. Em casa, os pais assegurar-se que o trânsito intestinal da criança funciona normalmente, sem prisão de ventre. Assim o excesso de bilirrubina desaparece mais rapidamente. Há assim que garantir que a criança se mantém bem-hidratada, consome bastante fibra e pratica exercício físico regularmente.
Icterícia neonatal: fototerapia, um tratamento feito através da exposição do bebé a uma luz azul especial que ajuda a reduzir os níveis de bilirrubina.
Destruição acelerada dos glóbulos vermelhos: transfusão de sangue, medicação, plasmaferese (processo que separa o plasma das células sanguíneas através de uma máquina. Este processo tem como objetivo remover elementos do plasma sanguíneo que possam ser responsáveis por certas doenças)
Hepatite: o tratamento varia, segundo o tipo de hepatite. A hepatite A resolve-se normalmente sem tratamento por si, enquanto que os tipos B e C requerem fármacos antivirais.
Vírus de Epstein-Barr: não existe uma cura antiviral para este vírus. Neste caso trata-se os sintomas como a febre e as náuseas. O mesmo sucede com outras causas para a icterícia.
Prevenção da icterícia
Não é normalmente possível evitar o surgimento da icterícia. Isto acontece no caso de a criança sofrer de uma doença autoimune, por exemplo, a qual faz aumentar os níveis de bilirrubina. Contudo, é possível evitar certas doenças que causam icterícia, como a hepatite e o vírus de Epstein-Barr. Assim, deve-se evitar a partilha de certos objetos de uso pessoal como copos e escovas de dentes. A hepatite A e C podem ser prevenidas através da vacinação.
Referência: Healthline; Medline Plus; MSD Manuals
A informação presente neste artigo não pretende, de qualquer forma, substituir as orientações de um profissional de saúde ou servir como recomendação para qualquer tipo de tratamento.
Assim sendo, perante qualquer incómodo, aconselhamos que se desloque ao seu médico assistente a fim de obter o diagnóstico e tratamento adequado.