Graças aos avanços e evolução dos vários ramos da medicina, nomeadamente das técnicas de diagnóstico pré-natal, é possível, nos dias que correm, proceder à identificação de alguns problemas de saúde do feto in útero e a determinação do risco da sua ocorrência.
Interrupção terapêutica da gravidez
Análise do Quadro Legal
Hoje em dia estão disponíveis meios e técnicas que permitem um melhor e mais precoce diagnóstico de doenças genéticas e malformações fetais, facultando aos pais o poder de decisão sobre a saúde do feto, muito antes do seu nascimento.
Na prática, o diagnóstico pré-natal é constituído pelo conjunto de procedimentos com o objetivo de avaliar se um embrião ou feto é portador de uma determinada anomalia congénita – situação que até há poucos anos só seria possível no momento do nascimento.
Paralelamente, as interrupções de gravidez por malformações fetais têm aumentado significativamente, fruto do já referido desenvolvimento das técnicas de diagnóstico pré-natal e ao enquadramento legal da interrupção voluntária da gravidez.
Diploma legal que exclui a ilicitude da interrupção da gravidez
O diploma legal que exclui a ilicitude da interrupção da gravidez tem sofrido alterações ao longo dos anos. No nosso enquadramento jurídico encontra-se em vigor a Lei n.º 16/2007, de 17 de Abril, que trouxe alterações ao Código Penal Português, elencando as situações em que se verifica uma exclusão da ilicitude nos casos de interrupção voluntária da gravidez.
Em Portugal, não é punível a interrupção da gravidez quando:
a) Constituir o único meio de remover perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida;
b) Se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida e for realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez;
c) Houver seguros motivos para prever que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação congénita, e for realizada nas primeiras 24 semanas de gravidez, excecionando-se as situações de fetos inviáveis, caso em que a interrupção poderá ser praticada a todo o tempo;
d) A gravidez tenha resultado de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e a interrupção for realizada nas primeiras 16 semanas.
e) For realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez.
Imposição temporal
No que diz respeito à al. c), salientamos a imposição temporal referida: a interrupção da gravidez só é admitida até às 24 semanas de gravidez. Nestes casos é necessário averiguar se a anomalia presente no embrião/feto preenche os requisitos legais para uma interrupção da gravidez lícita, por exemplo, verificar se é grave e incurável.
Contudo, se tal anomalia não puder ser identificada antes do termos do aludido prazo de 24 semanas, já não se pode alegar o dano da anulação da possibilidade de decidir interromper a gravidez, por já se ter ultrapassado o prazo legal para o efeito. Por outro lado, no caso de situações de feto inviáveis, a interrupção pode ser efetuada a todo o momento.
Verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez
É de salientar ainda que a verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é sempre certificada em atestado médico, escrito e assinado antes da intervenção por médico diferente daquele por quem, ou sob cuja direção, a interrupção é realizada.
No caso de a mulher grávida ser menor de 16 anos ou psiquicamente incapaz, respetiva e sucessivamente, conforme os casos, o consentimento é prestado pelo representante legal, por ascendente ou descendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes da linha colateral.
Por outro lado, se não for possível obter o consentimento nos termos dos números anteriores e a efetivação da interrupção da gravidez se revestir de urgência, legalmente o médico decide em consciência face à situação, socorrendo-se, sempre que tal seja possível, do parecer de outro ou outros médicos.