As crianças precisam de sair da sala de aula, de passar os momentos de recreio ao ar livre, manter o contacto, mesmo que com as devidas medidas de segurança. Não podem ficar fechadas na sala de aula.
Foi esta a principal ideia transmitida por Carlos Neto, professor da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa, entrevistado pela Rádio Observador.
Para este investigador é fundamental apostar na importância do movimento para a saúde e autonomia das crianças. O professor não concorda que o uso constante da máscara e o recreio passado dentro de quatro paredes, seja o preço a pagar para haver ensino presencial.
“Em tempos incertos e estranhos, eu acho que é necessário desconstruir, principalmente nas primeiras idades até à puberdade, esta ideia da pandemia do medo que é pior que o vírus”, disse Carlos Neto.
Segundo o professor, não se pode proibir as crianças de terem atividades ao ar livre, de socializarem umas com as outras, mesmo que isso implique proximidade e toque, em algumas ocasiões.
Um duplo confinamento na sala de aula, depois daquele que foi obrigatório a partir de março, é uma “violência enormíssima do ponto de vista psicológico”, acrescentou ainda.
O especialista afirma que é preciso ter confiança que as crianças transportam uma carga viral menor. Precisam de tempo e de espaço disponíveis para serem crianças na escola.
Carlos Neto recorda que a solução, noutras épocas de doença e pandemia, nomeadamente da gripe espanhola e da tuberculose, foi trazer as crianças para a rua, para o ar livre. Seria importante, acrescentou, que as autarquias melhorassem os espaços exteriores da escola e outros públicos, para que a segurança continuasse a existir e mantendo a integridade de cada grupo.
“Parece que estamos a criar um estado policial, um estado militar dentro da escola, que não é agradável, obviamente, para crianças pequenas”, declarou.
Questionado acerca do impacto que estas medidas mais restritivas podem ter na saúde das crianças, Carlos Neto levantou um problema que considera muito importante, além da óbvia falta de socialização.
“A recuperação das aprendizagens escolares não pode ser só um objetivo. O objetivo é também recuperar os atrasos que provocou o confinamento, no que diz respeito à saúde física. As crianças têm de se mexer”, explicou. A saúde mental e a recuperação de aprendizagens é tão importante como a saúde física e o contacto com a natureza.”
O professor da Faculdade e Motricidade Humana disse ainda notar, na sua atividade profissional, que há mais crianças com excesso de peso e com “iliteracia motora”, resultado da inatividade física. Apelida mesmo de obsoleta, a ideia de manter as crianças dentro da sala de aula durante todo o dia.
Como manter as regras apertadas para determinados momentos, como as aulas de Educação Física? Carlos Neto diz que não lecionar esta disciplina ou torná-la numa aula teórica não faz sentido. Podem ser dadas, apenas com alguma simplificação de determinadas atividades, sobretudo ao ar livre, defende.
Ainda assim, admite que para crianças a partir dos 12 anos, é necessário fazer as alterações adequadas, sem nunca proibir a atividade física, que considera fundamental.
28 de setembro 2020