O que é lactose? A intolerância é hereditária? Quem pode ser afetado? Podemos evitá-la? Quando se fala de intolerância à lactose os factos e os mitos confundem-se. A Dra. Inês Pádua, nutricionista, esclarece estes e outros conceitos neste artigo.
Intolerância à lactose
1. O que é?
A lactose é um hidrato de carbono, ou um açúcar, encontrado naturalmente no leite. É composta por uma molécula de glicose e uma molécula de galactose, que são os açúcares simples do leite produzidos pelos mamíferos.
A lactose é “degradada” no nosso organismo pela enzima lactase, para que o leite e outros produtos lácteos possam ser mais facilmente digeridos. Contudo algumas crianças, jovens ou adultos (incluindo idosos), podem apresentar deficiência (e, consequentemente, uma atividade diminuída) ou ausência total desta enzima.
2. O que acontece quando a atividade da enzima lactase diminui?
Se não existir lactase suficiente no organismo, a lactose não é convenientemente digerida (partida em componentes mais pequenos) e ao chegar ao cólon irá ser fermentada pelas bactérias intestinais.
Esta fermentação e a digestão incompleta da lactose leva a produção de gases (flatulência) e também a sintomas gastrointestinais como distensão abdominal (barriga inchada), cólicas e diarreia.
3. Quando aparecem os sintomas?
Os sintomas da intolerância podem manifestar-se em alguns minutos após a ingestão mas também podem ser muito mais tardios, várias horas depois. É também relativamente comum que os sintomas sejam dose-dependentes, isto é, que quanto maior for o consumo mais expressivos são os sintomas.
4. O bebé pode nascer com intolerância?
Embora existam casos de intolerância congénita ou hereditária (sobretudo no norte da Europa) é uma situação muito rara. Assim, é bastante incomum que o bebé nasça sem a capacidade de produzir lactase ou com níveis baixos, mesmo que os seus pais sejam intolerantes.
Inclusivamente, nos casos normais, a atividade máxima da lactase verifica-se precisamente no momento do nascimento, o que é desejável para a digestão do leite materno. Posteriormente a atividade vai reduzindo progressivamente, especialmente após os 2-3 anos. A intolerância pode, contudo, ocorrer em bebés prematuros.
5. O leite materno tem lactose?
Sim, tal como o leite de todos os mamíferos, o leite materno tem lactose. Ainda assim, como vimos é muito pouco provável que um bebé até aos 2-3 anos de idade apresente intolerância à lactose, pelo que não deve excluir a amamentação com medo de cólicas ou outros sintomas.
Adicionalmente, apesar de o leite materno ser rico em lactose também possui agentes facilitadores que auxiliam na sua digestão e o bebé só beneficia do leite materno até indicação médica em contrário.
6. Alergia ou intolerância?
Não existe alergia à lactose, mas sim intolerância, sendo que intolerância à lactose e alergia às proteínas do leite de vaca são duas coisas totalmente distintas. Numa alergia, geralmente a uma proteína, está envolvido o sistema imunitário e o mínimo vestígio do alimento pode levar a complicações graves e até fatais.
No caso de uma intolerância está envolvido o sistema gastrointestinal, podendo os sintomas (maioritariamente gastrointestinais) variar com diversos fatores como a quantidade consumida, o grau de insuficiência da lactase e a composição nutricional dos alimentos.
7. Existem medicamentos com lactose?
Sim, existem medicamentos, inclusivamente alguns não sujeitos a receita médica, que contêm lactose e que por isso podem não se recomendados para intolerantes. Embora os sintomas possam variar com a quantidade de lactose ingerida, será sempre importante que se aconselhe com o seu médico ou farmacêutico.
8. Quem pode ser afetado por esta intolerância?
Todas as pessoas podem desenvolver intolerância à lactose, sabendo-se, inclusivamente, que cerca de 70% da população mundial é intolerante. Para além da intolerância congénita (rara) existem dois tipos de intolerância:
- Intolerância primária: a pessoa vai perdendo, progressivamente e definitivamente a quantidade de lactase.
- Intolerância secundária: ocorre temporariamente e de forma reversível, devido, por exemplo, a doenças gastrointestinais como gastroenterites severas, doença de Crohn e doença celíaca com lesões não tratadas.
9. Como é feito o diagnóstico?
Para além da avaliação da história clínica do doente, sintomas e resposta à evicção alimentar (supressão da lactose na alimentação durante 2 a 4 semanas e verificar a evolução dos sintomas), existem outros procedimentos de diagnóstico.
Entre eles, a biopsia da mucosa intestinal, doseamentos do açúcar no sangue ou medição do hidrogénio no ar expirado após ingestão do açúcar (teste respiratório de hidrogénio). Este último é o método mais simples, sendo também o mais usado atualmente.
10. Como é realizado o tratamento?
O tratamento da intolerância não implica necessariamente a exclusão total de leite e derivados da alimentação da criança uma vez que o aparecimento dos sintomas depende, muitas vezes, da quantidade de lactose ingerida e que já existem diversos produtos no mercado sem lactose (leite e iogurtes, por exemplo).
Mesmo para crianças mais pequenas, entre os 6 meses a 2 anos, podem ser utilizadas fórmulas especiais isentas de lactose. Adicionalmente, os derivados do leite (como queijo e iogurte) costumam ser melhor tolerados porque apresentam menor quantidade de lactose.
De referir também que existem no mercado comprimidos com lactase para tomar antes da ingestão de produtos lácteos, mas que devem ser reservados a momentos específicos (e não usados diariamente), quer pelo seu custo, quer pela sua eficácia.