Sinais-alarme-diferentes-areas-motora-audicao-e-linguagem

Sinais-alarme-diferentes-areas-motora-audicao-e-linguagem

Sinais de alarme nas diferentes áreas do desenvolvimento (motora, audição e linguagem)

Área motora

Esta é a área mais frequentemente citada no primeiro ano pelos pais, que estão preocupados com o atingir de vários marcos importantes, sobretudo a aquisição da marcha.

É, no entanto, a área com menor correlação com as capacidades cognitivas (1,4). A área motora é sequencial, pré-programada, dependente da mielinização do sistema nervoso e expressa o padrão evolutivo da espécie. É muito pouco dependente da etnia, sexo e meio sociocultural (1,9).

O atraso de desenvolvimento motor tem especial importância por se poder associar a várias patologias médicas subjacentes. Estas devem ser identificadas o mais precocemente possível, tendo em vista a intervenção terapêutica adequada e aconselhamento genético, se pertinente (3,7).

Apesar de existir uma grande variação individual na aquisição dos vários marcos de desenvolvimento, devem ter-se em mente alguns sinais de alarme, que estão esquematizados nos quadros

Alguns sinais subtis devem ser valorizados mesmo em idades precoces.

Aos três meses, as mãos não devem estar fechadas mais de 50% do tempo, podendo isto corresponder a um sinal de paralisia cerebral.

O desenvolvimento de mão dominante antes dos 15 meses pode indicar problemas neurológicos subjacentes. Qualquer assimetria na postura deve também ser valorizada (3,4).

Ao avaliar uma criança sob o ponto de vista motor, não podem ser esquecidas algumas variantes do normal desenvolvimento.

Um dos aspectos mais sujeitos a variação é o gatinhar. Estima-se que cerca de 4,3% das crianças não chegue a gatinhar, utilizando formas alternativas de deslocação, como sendo os natígrados (deslocação arrastando a região glútea) e os plantígrados (palmas e plantas apoiadas no chão), recusando estas crianças outras formas de locomoção mais habituais.

Foram elaboradas tabelas de percentis com as aquisições motoras principais pela OMS [Organização Mundial da Saúde], através da observação de crianças normais, que demonstram a enorme variabilidade que pode existir nestas aquisições (9).

Área da audição e linguagem

A vinculação precoce entre um bebé e os seus pais constitui a primeira grande aquisição em termos sociais e é determinante para o emergir de competências noutras áreas, nomeadamente na comunicação (4).

Das primeiras vocalizações até ao estabelecimento de uma linguagem há uma evolução enorme, em muito seguindo um padrão previsível, com pequenas variações individuais (10).

 

São consideradas três fases distintas na aquisição da linguagem: as vocalizações pré-linguísticas no primeiro ano de vida, uma fase de transição no segundo ano de vida e a fase de verbalização no terceiro ano de vida. Esta sequência é previsível, constitui um processo neuromaturacional, logo vai ter implicações diagnósticas e prognósticas (1,4).

Existem algumas ideias erróneas sobre possíveis etiologias do atraso de linguagem. Assim, a otite média recorrente raramente condiciona atraso de linguagem.

Por outro lado, crianças com surdez congénita tipicamente têm um desenvolvimento motor, cognitivo e psicológico normal no primeiro ano de vida. Atingem também os objectivos em termos de linguagem nos primeiros 6 a 8 meses (4,11).

A regressão ou paragem do desenvolvimento na área da linguagem entre os 18 e os 24 meses é especialmente preocupante, sobretudo se associada a isolamento social, podendo corresponder aos primeiros sinais de perturbação do espectro do autismo (6).

As perturbações da linguagem podem ser variadas, desde problemas de articulação a afasias de expressão ou compreensão, e têm uma incidência estimada entre 3 a 15% da população.

Dentro das etiologias possíveis incluem-se anomalias oromotoras (associadas a dificuldades alimentares), défice auditivo, atraso global do desenvolvimento e perturbações do espectro do autismo. Tal como nas restantes áreas do desenvolvimento, o estabelecimento de uma etiologia específica permite uma intervenção mais dirigida e, por isso, mais eficaz (11-13).

Ao avaliar uma criança com atraso da linguagem é particularmente relevante verificar se existe também atraso noutras áreas. Poder-se-á preconizar uma atitude expectante apenas abaixo dos 3 anos, se existe uma boa compreensão verbal, boas capacidades comunicativas, audição normal, restante desenvolvimento normal e história familiar de atraso da linguagem (11).

O atraso isolado da linguagem pode ser considerado uma variante do normal, atingindo cerca de 10 a 15% das crianças e, em regra, existe linguagem funcional antes dos 4 anos e normal aos 5. A gaguez “fisiológica” também é muito frequente, existindo em 3% das crianças entre os 2 e os 4 anos.

Consiste num discurso interrompido, fraccionado, sem que coexista atraso da linguagem, em que na larga maioria dos casos se assiste a resolução espontânea (1,11,12).

Pelo contrário, são indicadores de gaguez patológica tensão facial significativa a acompanhar o discurso, prolongamento de alguns sons durante mais do que alguns segundos, tentativa de falar sem que seja emitido qualquer som, tom mais agudo da voz ao gaguejar, coexistência de tiques, gaguejo em mais de 10% das palavras ou atitude de evicção de comunicação. Outros factores de risco incluem história familiar de gaguez ou persistência de gaguez durante mais de doze meses (1,11).

Visuomotricidade

A visuomotricidade refere-se às competências de resolução de problemas que envolvam as mãos e membros superiores e a sua coordenação com a visão (1).

É o resultado final da inter-relação entre visão, motricidade e funções cognitivas, pelo que défices em qualquer uma destas capacidades interferem com o desenvolvimento das competências visuomotoras.

É uma área particularmente importante, por ser a que apresenta maior correlação com a inteligência não verbal (1,4). Desde idades muito precoces, as aquisições visuais que envolvem sequenciação e discriminação (alerta visual, fixação e perseguição visual) são fortemente preditivas do tipo de desempenho futuro. É também através do desenvolvimento de competências nesta área que se vai iniciar a imitação e o jogo simbólico, importantes como forma de desenvolvimento cognitivo e também de estabelecimento de relações sociais (1,14,15).

Em lactentes e crianças pequenas estas capacidades são avaliadas pela observação da interacção da criança com pequenos objectos (cubos, puzzles, brinquedos).

Na idade escolar, os testes de desenho que traduzem percepção visual e organização espacial, apresentam uma boa correlação com capacidades intelectuais e eventuais distúrbios da aprendizagem académica (4,14).

Área do comportamento e interacção social

A relação entre a criança e os pais durante os primeiros anos de vida condiciona as suas futuras interacções e a forma como se vê a si própria. É, por isso, a base do seu modo de funcionamento em sociedade e é determinante para o seu equilíbrio emocional.

O padrão de comportamento social tem influência reduzida de factores biológicos, estando sobretudo dependente do ambiente em que a criança está inserida (1,4,6).

Infelizmente, em muitos casos este equilíbrio é posto em causa muito precocemente, tanto por patologia inerente à própria criança como por problemas referentes aos pais. Vários factores ambientais podem influenciar negativamente o desenvolvimento, tais como meios socialmente desfavorecidos, depressão materna, conflitos conjugais e outros (2).

A vinculação ao prestador de cuidados constitui a base a partir da qual as futuras interacções vão ser estabelecidas. Deverá estar bem patente entre os 12 e os 14 meses, caracterizando-se por um comportamento de aproximação, ansiedade de separação e medo de estranhos (4,6).

 

A consulta de vigilância é um local propício para observar esta desconfiança perante estranhos e situações novas. O contacto ocular pobre ou choro inconsolável mesmo quando confortado pelos pais, são sinais de alarme em qualquer idade. A agressividade excessiva, movimentos repetitivos e falta de interesse nas pessoas constituem também sinais preocupantes (6).

A interacção social é a súmula de todas as áreas do desenvolvimento: depende de capacidades motoras adequadas, capacidade de resolução de problemas e linguagem apropriada (1).

Em crianças e adolescentes com atraso global do desenvolvimento, as aquisições nesta área têm um particular interesse porque determinam o comportamento adaptativo presente e reflectem a capacidade de viver em sociedade (7).

Nesta área estão compreendidos alguns sinais de alarme para perturbações do espectro do autismo, que devem ser valorizadas precocemente, alguns a partir do 1º ano de vida: falta de reciprocidade afectiva, inexistência de sorriso social e vontade de partilhar afectos, predomínio de afectos negativos e pouco interesse na comunicação (6).