A separação de um casal é um processo complicado e, muitas vezes, doloroso, especialmente para os mais pequenos.
Esta separação marca o fim da relação conjugal, mas não da relação parental, uma vez que “entre pais e filhos não há divórcio” e a criança deve manter um convívio regular com ambos os pais e respetivas famílias.
A resposta e o comportamento da criança perante um divórcio dependem, acima de tudo, “da forma como os pais lidam com o mesmo – como e quando o explicam à criança, como o sentem, como aprendem a gerir as mudanças inevitáveis que dele decorrem, como protegem a criança e a ajudam a manter uma imagem positiva de ambos os pais”, explica Rute Agulhas, Psicóloga e Terapeuta Familiar.
Como contar aos filhos?
Os pais têm tendência a subestimar a capacidade de compreensão dos filhos. As crianças têm, frequentemente, noção que as coisas estão diferentes e que algo aconteceu (que e trará mudanças às suas vidas):
- Converse com o seu parceiro primeiro e decidam o que vão dizer à criança;
- Escolha uma altura tranquila para conversar com o seu filho, de forma clara e objetiva, e sem pressa;
- Este momento é para a criança e não deve ser misturado com expressões emocionais dos pais. Por isso, se acha que ainda não está preparado, dê algum tempo até sentir que está pronto para a conversa;
- Explique de que forma estão a pensar organizar a vida a partir deste momento;
- Não minta, mas também não dê mais explicações que as necessárias. Reforce que os pais continuam a gostar da criança e que vão estar sempre disponíveis.
Lembre-se que os seus problemas com o seu cônjuge não devem passar para as crianças. Para o psicólogo José Manuel Aguilar Cuenca, seja claro ao transmitir que “a decisão que tomaram não tem nada a ver com o amor que sentem por elas. Esclareça que é uma decisão dos pais. Assim, evitam que tomem decisões dolorosas que façam com que se aliem a um ou a outro. As crianças costumam apoiar quem sentem mais débil, aquele que acham que necessita de maior proteção com a separação da família. A consequência disto seria uma aliança contra um dos pais”.
E os especialistas defendem que, num divórcio, tomar partido entre a mãe e o pai nunca é saudável para uma criança. Além disso, ser coagido por um dos pais a ficar do lado de um deles pode resultar em danos psicológicos graves.
É muito importante ter a noção que “os filhos não são a sua terapia, nem tão pouco uma muleta para se apoiar”. Os pais devem ser os seus mentores, a base a partir da qual os mais pequenos conhecem e interpretam o mundo à sua volta.
As mudanças no comportamento das crianças
Após um divórcio, é normal notar algumas mudanças no comportamento. Podem refletir-se no sono, na alimentação, na escola (nomeadamente, nos resultados) e num constante questionar das regras em casa. É frequente as crianças mostram-se mais inquietas ou desafiarem continuamente os pais.
Como lidar com estas alterações?
- Em primeiro lugar, mantenha a calma. Estas mudanças são passageiras;
- Procure rapidamente voltar à normalidade e cumprir com as rotinas;
- Informe as pessoas mais próximas sobre o que está a acontecer e avise um professor ou o diretor de turma do seu filho;
- Respeite o seu papel enquanto pai/mãe. Não transforme o seu filho num amigo. Continue a impor regras e a zelar pelo cumprimento das tarefas e responsabilidades da criança;
- Não demonstre atenção/carinho de forma excessiva nem faça todas as vontades ao seu filho. Isto pode ser entendido pela criança como um ganho.
Após o divórcio, é comum as crianças interpretarem o “comportamento dos pais como submissão aos seus desejos. Estas crianças podem pensar que são elas que tomam as decisões, condicionando a organização familiar aos seus desejos infantis. Podem chegar a aproveitar-se da comunicação disfuncional entre os pais, manipulando-os segundo os seus próprios interesses”, alerta o psicólogo.
Se considerar necessário, procure ajude profissional. O especialista vai garantir que o seu filho é ouvido e vai ajudar a gerir as suas emoção.
O divórcio consoante a idade dos filhos
As crianças respondem de forma diferente à separação dos pais consoante a idade:
- 0 aos 3 anos: Até aos 3 anos, a criança precisa da presença e atenção contínua de ambos os pais. Apesar de não conseguirem entender o que se passa entre os progenitores, muitas crianças sentem ansiedade que, consequentemente, altera o seu comportamento. Certifique-se que há um acompanhamento com qualidade dos pais. É nesta idade que constroem os seus afetos e se ligam a quem cuida delas;
- 3 aos 7 anos: Nestas idades, as crianças não sabem expressar o seu mal-estar e as expressões somáticas são a única linguagem que lhes permite comunicar. É frequente terem dores de barriga e de cabeça, birras ou até mesmo recuperarem comportamentos infantis. Reforce o quanto gosta do seu filho e que ambos os pais estarão sempre disponíveis. Quando começarem a surgir as saudades pelo progenitor mais ausente, procure facilitar a comunicação com o ex-cônjuge, de forma a acalmar a ansiedade da criança;
- A partir dos 7 anos: A raiva é um dos sentimentos mais comuns nesta idade, tal como aliarem-se a um dos progenitores. Deve reter rapidamente estes comportamentos, pois poderão ter implicações negativas ao longo dos anos. Estas “alianças” surgem, sobretudo, pelo “interesse da criança, para se livrarem da disciplina de um progenitor mais rigoroso ou pelo desejo de fazer pagar o pai ou a mãe pela decisão de quebrar com a convivência”;
- A partir dos 14 anos: Crianças ou adolescentes? Nesta idade, há um distanciamento face aos pais, na medida em que os amigos passam a ser o centro das suas vidas. Daí a importância de trabalhar de perto e de forma correta, desde o primeiro dia, o processo de separação para que os filhos não se afastem de casa, procurando e refugiando-se na companhia dos colegas.
Promova o bem-estar e procure apoio na família
O conflito destrói as emoções positivas do seu filho perante os pais. José Manuel Aguilar Cuenca reforça que o “ódio não nos dá nada e consome tudo em que toca, impede a comunicação, anula a nossa capacidade de compreender o outro e de lhe dar um papel na vida dos nossos filhos”.
Com a separação do casal, alguns pais desenvolvem comportamentos que interferem com o bem-estar de todos. Por isso, tenha em conta:
- Não desrespeite nem discuta com o seu ex-parceiro à frente do seu filho. Estudos relatam maior risco de ansiedade e depressão em crianças que assistem a discussões ou trocas de palavras menos amigáveis entre os pais. Para além disso, situações de alto conflito criam um ambiente de stress que não é adequado para o desenvolvimento dos mais novos;
- Não seja hostil nem diga mal do ex-cônjuge ao seu filho. Lembre-se que para existir conflito, tem que haver duas partes. Por isso, contribua da melhor forma para que o seu filho continue a ter uma imagem positiva de ambos os pais. Esta atitude é extremamente importante para que a criança não tire partidos nem seja tendenciosa para um dos pais.
E, claro: a família não termina nos pais. Os novos companheiros e os avós são figuras fundamentais na vida das crianças e um grande apoio na sua educação, pelo que a separação de um casal nunca deve implicar a perda dessa ligação.
No fundo, os pais devem enfrentar o divórcio com maturidade e respeito, assumindo que a estabilidade dos filhos depende, em muito, dessa atitude. Para mais dicas e orientações sobre este processo, sugerimos a leitura do guia preparado pela Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos.