As orientações da pediatria moderna são conhecidas em Portugal e estão adotadas por muitos especialistas. Conheça os 25 mitos da pediatria.
Os 25 Mitos da pediatria
1. Música na gravidez
Não é preciso nascer para ouvir. Hoje admite-se que o feto tem capacidades auditivas a partir das 12 semanas de gravidez e guarda memória dos sons após o nascimento.
Recomenda-se a audição de sons graves porque têm um efeito calmante e a música clássica está entre os estilos adequados. Os ritmos binários têm a vantagem acrescida de se assemelharem ao batimento do coração da mãe.
Uma curiosidade: a cadência com que as mães embalam é igual ao seu ritmo cardíaco e é por isso que o bebé adormece mais facilmente.
2. Aleitamento
Evitar alimentos como laranjas, cebolas, leguminosas ou chocolates não diminui as cólicas no bebé. A alimentação da mulher deve ser variada desde a gestação porque está provado que o feto inicia o desenvolvimento das células sensíveis ao sabor às 14 semanas de gravidez.
Todos são unânimes sobre os benefícios da amamentação exclusiva até aos seis meses de vida do bebé e provou-se que estão erradas as teorias sobre a fraca qualidade do leite muito líquido ou que não escorre quando é deitado num copo. O aleitamento é prioritário e deve começar ainda na sala de partos.
3. Esterilização
Ferver ou esterilizar biberões e tetinas não é necessário se os pais lavarem frequentemente, e bem, as mãos. As doenças infeciosas são menos frequentes e em condições normais de habitabilidade e de higiene basta uma lavagem que elimine os resíduos.
4. Alimentos
É um erro excluir alimentos como peixe, gema de ovo, carne de porco e frutas nos primeiros tempos de vida. A seleção visava prevenir alergias, mas as organizações internacionais defendem que atrasar a diversificação alimentar, mesmo em alérgicos, não traz benefícios.
Outro erro antigo: não se deve obrigar a comer nem negociar alimentos por alimentos – por exemplo, dar uma bolacha para compensar ter comido sopa – e os legumes e frutas devem estar sempre na mesa porque a sua presença influenciará a alimentação na vida adulta.
No passado, os alimentos eram introduzidos com o aparecimento dos dentes e agora são recomendados aos quatro meses, quando não há amamentação.
5. Suplementos alimentares
Vitaminas para quê? A sociedade moderna caracteriza-se pela abundância e uma dieta equilibrada é suficiente. A exceção, sobretudo no primeiro ano de vida, é a vitamina D, que gerações reforçaram com “colheradas” de óleo de fígado de bacalhau.
A tradição tem sido recuperada sob outras formas: os ácidos gordos são decisivos na formação das membranas cerebrais e estão a ser redescobertos em óleos de peixes de profundidade.
6. Peso
Gordura não é formosura. Cada bebé tem o seu ritmo e as variações nem sempre são sinal de doença. Os pediatras afirmam que os pais modernos se preocupam em excesso com o crescimento e recomendam que pesagem e medição só sejam feitas nas consultas de rotina.
7. Sono
Não tem fundamento o medo de que os bebés deitados de costas podem sufocar no caso de bolçarem. Em situações normais, o corpo humano está preparado para evitar estas situações.
O medo levou muitos pais a deitarem os recém-nascidos de barriga para baixo, mas hoje é reprovável e perigoso.
É mandatório deitar os bebés de barriga para cima, pelo menos, até aos seis meses. Depois, é o próprio bebé que escolhe a posição mais confortável. O sono solitário foi estimulado por se acreditar que promovia a autonomia, mas não está provado.
8. Morte súbita
“Abafar” os bebés não é o perigo principal. A morte de crianças saudáveis por razões inexplicáveis continua a registar-se e estudos recentes têm evidenciado que é mais comum quando os pais são fumadores, em famílias monoparentais e quando o bebé é deitado de barriga para baixo.
9. Choro
As lágrimas são mais do que fome ou fralda molhada. Descobriu-se que os bebés são muito sensíveis a estímulos e também precisam de aliviar a tensão. Ou seja, às vezes basta deixar chorar um bocadinho para perceber a mensagem.
10. Banho
Esperar pela digestão para dar banho é um mito. A água utilizada está morna e não existe choque térmico, responsável pela congestão. Além disso, o leite é de fácil digestão. O banho do bebé deve ser um prazer e a regra é “água quanto baste e pouco produto de limpeza”, sobretudo com glicerina, porque seca e irrita a pele em demasia.
11. Pele
Pó de talco fora da lista. A limpeza exagerada é inimiga da pele e um banho seguido de uma loção hidratante é suficiente. Na zona da fralda é necessária parcimónia no uso de toalhetes, pois limpam a sujidade, mas também podem arrastar a camada superficial da pele.
Quando a fralda só está molhada e não existe irritação não é necessário usar creme ou pastas sob risco de provocar uma sensibilização excessiva. E o pó de talco está fora de moda porque as partículas podem ser inaladas pelo bebé.
12. Fralda
O uso precoce do bacio está fora de questão. Os pediatras estão a recuperar a tradição de retirar a fralda só aos dois anos porque o controlo precoce do esfíncter pode, afinal, trazer problemas.
13. Botas ortopédicas
Não vale a pena olhar para os pés antes dos dois anos. A ortopedia moderna respeita as regras de crescimento do pé e da marcha das crianças e qualquer calçado que faça alguma contenção interfere com a evolução normal.
É ponto assente que é o exercício e não o calçado ortopédico ou formativo que cumpre a missão fisiológica. Sempre que possível, as crianças devem andar descalças e usar sapatos que protejam apenas o tornozelo e o calcanhar.
14. Creche
A socialização, afinal, só começa aos três anos. Na sociedade atual mães e avós trabalham e os bebés vão para a creche cada vez mais cedo. Contudo, a maioria dos pediatras regressou ao passado para recomendar os cuidados dos avós até aos três anos. Argumentam que os ganhos de afeto compensam.
15. Febre
A temperatura não é doença. A maioria das crianças faz quatro dias de febre e não é preciso baixar a temperatura de imediato como querem os pais dos nossos dias. Os médicos alertam que a febre é muitas vezes é um mecanismo de defesa do organismo e que um sinal de serenidade é a criança continuar a brincar.
16. Tosse
Adeus ao xarope. Tossir é uma forma do corpo para eliminar secreções e melhorar a respiração. Trata-se de um sintoma e não de uma doença e nos primeiros anos de vida não são recomendados inibidores.
17. Aerossóis
São os grandes terapeutas do século XXI. Ajudam a respirar melhor, contudo, os médicos têm dúvidas sobre o que os próximos avanços podem revelar sobre a sua utilização.
18. Ginástica respiratória
Comum na década de 90 revelou-se desnecessária. Era usada para bronquiolites e hoje sabe-se que aumentam o cansaço e as dificuldades de respiração.
19. Remédios caseiros
Vivem-se tempos de medicação excessiva. As precauções sobre o uso de remédios estão na ordem do dia e a regra é recuperar remédios caseiros como o xarope de cenoura e os preparados com mel.
20. Vacinas
O calendário mudou. As crianças dos nossos dias são mais vacinadas – e dizem os pediatras, estão mais protegidas – e já não é preciso recomeçar do zero quando há atrasos muito grandes.
21. Flúor
As gotas outrora comuns foram trocadas pelos dentífricos. Atualmente é promovida a lavagem cada vez mais precoce dos dentes, aliás, logo que a dentição aparece na vida do bebé.
22. Brinquedos
Quantos mais, pior. As crianças precisam de estimular a imaginação e para isso não podem ter muitos brinquedos para poderem explorá-los ao máximo, dando-lhe várias utilizações. Os pais devem guardar os presentes, optando pela distribuição ao longo do ano.
23. Animais
Os eternos amigos estão de volta. Após várias teorias sobre o risco acrescido de alergias, cães, gatos, pássaros e outros animais são desejáveis para o desenvolvimento da criança.
24. Desporto
O cloro não faz alergia. A prática desportiva é defendida para o desenvolvimento psicomotor e a natação volta a liderar as preferências. A qualidade da água das piscinas melhorou e os bebés podem nadar a partir do sexto mês de vida. Só é preciso limpar o cloro com um banho abundante e dar bastante água para minimizar a sua presença no estômago.
25. Regras
O ónus dos pais sobre a personalidade dos filhos está mitigado. Passou a ser admitido que há crianças difíceis que complicam a vida das famílias e que as regras são, por isso, indispensáveis. A negociação deve existir, mas sem rendição, em especial, dos pais.
Fundamentos
Teses de médicos portugueses
As orientações da pediatria moderna são conhecidas em Portugal e estão adotadas por muitos especialistas. O Expresso ouviu alguns pediatras com trabalhos publicados nesta área e com funções em hospitais públicos de referência.
Entre eles, o chefe do Serviço de Pediatria do Hospital de Cascais, Luís Pinheiro; o presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, Anselmo da Costa; o neonatologista do Hospital de Santa Maria, António Simões de Azevedo; o presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria, Luís Januário, e o diretor da Pediatria Médica do Hospital de Dona Estefânia, Gonçalo Cordeiro Ferreira.
Vera Lúcia Arreigoso – Texto publicado na edição do Expresso de 6 de dezembro de 2008